23.2.11

Zeca Afonso - Maria Faia



Nos 24 anos da morte de Zeca Afonso.
Vive na nossa memória!

14.2.11

LUGAR ONDE - Página no semanário BADALADAS de 18 de Fevereiro 2011



ANTOINE DE SAINT-EXUPÉRY
MUITO MAIS QUE UM PRINCIPEZINHO


Em redor de Antoine de Saint-Exupéry criou-se uma lenda e um equívoco. A lenda está ligada à vida de aviador em tempo de pioneiros do ar. O equívoco resulta da redução da sua obra literária à história do “PRINCIPEZINHO”.

Vejamos mais de perto. Saint-Exupery ( 1900-1944) foi de facto um pioneiro da segunda fase da aviação, quando os gloriosos malucos foram substituídos por especialistas de voo com brevets e conhecimentos de engenharia aeronáutica. Tornou-se um aviador profissional, participou no estabelecimento de novas rotas e, sobretudo, nos serviços aeropostais que revolucionaram as comunicações. Na Segunda Grande-Guerra foi piloto de aviões de reconhecimento em missões de alto risco e nesse serviço perdeu a vida, no sul de França. O avião despenhou-se no Mediterrâneo e o seu corpo nunca foi encontrado.
Pelo meio sucederam-se viagens de missões lendárias em que sobreviveu a desastres tremendos. Numa delas esteve perdido no deserto do Sara, de onde regressou transformado. Encontrara o Principezinho, essa criança única que vive escondida em cada homem e só aparece quando a consciência da morte desvenda o essencial da vida.

Este breve relato – que não é uma história infantil! - continua a comover os homens de todo o mundo que não receiam conversar com esse menino que os acompanha pela vida fora. Mas está aqui o equívoco injusto: a obra de Antoine de Saint-Exupéry não se reduz a esse livrinho maravilhoso. Ele escreveu muito mais: páginas luminosas sobre o seu tempo, tornadas intemporais pela perspectiva humanista em que se colocou. O seu estilo, de um subjectivismo impressivo, radica na visão compassiva do homem, esse ser de imensa grandiosidade nos miseráveis limites da sua pequenez. Livros como Piloto de Guerra, Um Sentido para a Vida e Cidadela (todos traduzidos para Português pelo grande poeta Ruy Belo) fazem parte do património da Literatura Universal. Ou ainda Terra dos Homens ou Carta a Um Refém. Num tempo de graves incertezas como é o nosso, a leitura destas páginas abre perspectivas, alimenta a esperança, torna os homens mais Homens.


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VIDA E OBRA


Antoine de Saint-Exupéry nasceu em Lyon (França) no ano de 1900. Viveu grande parte da infância na Borgonha e na Provença, e estudou em Le Mans, Friburgo (Suíça) e Paris. Cumpriu o serviço militar em Estrasburgo, tornando-se piloto em 1922 (cerca de dez anos após a sua primeira experiência de voo). Voa sem¬pre que pode, e a sua vida une-se à aviação. Como piloto civil, colabora numa empresa de correio aéreo (no Norte de Africa e na América do Sul). No final de 1935, ao tentar estabelecer a ligação aérea Paris-Saigão, aterra de emergência no deserto da Líbia, sendo salvo por uma caravana de beduí¬nos; sofre depois (1938) acidente grave na Guatemala, quando procurava voar de Nova Iorque à Terra do Fogo. Entretanto, é inventor de diver¬sos aparelhos relacionados com a aeronáutica e repórter (Moscovo, 1935; guerra de Espanha, 1936 e 1937), e desenvolve a sua obra literária, num estilo inimitável, cada vez mais exigente e depu¬rado. Publica Courrier Sud (1928), Vol de Nuit (1931), Terre des Hommes (1939), Pilote de Guerre, Lettre a un Otage e Le Petit Prince(1943)

Postumamente, em 1948, é publicado o romance inacabado Citadelle e em 1956 um conjunto de textos dispersos, Un Sens à la Vie.

Profundamente empenhado na defesa da sua pátria durante a II Guerra Mundial, desapareceu no mar, a norte da Córsega, em missão de reco¬nhecimento fotográfico aéreo (31.07.1944). (in: Carta a Um Refém, ed. Grifo, Lisboa, 1995)

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PASSAGEM POR LISBOA


Em 1940 Saint-Exupéry passou em Portugal a caminho de Nova Iorque. Aqui se demorou alguns dias e visitou a Exposição do Mundo Português. No seu estilo marcado por intenso impressionismo subjectivo, traçou um quadro melancólico de Lisboa, onde se amontoavam os refugiados, em trânsito para os Estados Unidos.
Começa assim esse texto:

«Quando, em Dezembro de 1940, atravessei Portugal a caminho dos Estados Unidos, Lisboa surgiu-me como uma espécie de paraíso claro e triste. Falava-se lá muito, então, de uma invasão iminente, e Portugal aferrava--se à ilusão da sua felicidade. Lisboa, que edificara a mais deslumbrante exposição que já houve no Mundo, sorria com um sorriso um tanto pálido, como o daquelas mães que não têm quaisquer notícias de um filho que foi para a guerra e se esforçam por salvá-lo com a sua confiança: “O meu filho está vivo, visto que eu sorrio…”» ( Carta a Um Refém, ed. Grifo, Lisboa, 1995)

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TEXTOS DE SAINT-EXUPÉRY


«Porque o Homem da minha civilização não se define a partir dos homens. São os homens que se definem a partir dele. Há nele, como aliás em todo o ser, qual¬quer coisa que os materiais que o constituem não expli¬cam. Uma catedral é uma coisa totalmente diferente de um somatório de pedras. É geometria e arquitectura. Não são as pedras que a definem, é ela que enriquece as pedras com o seu próprio significado. Essas pedras cobram nobreza no facto de serem pedras de uma catedral. As pedras mais diversas servem a sua uni¬dade. A catedral absorve até as goteiras mais irrequie¬tas do seu cântico.

Mas, a pouco e pouco, fui perdendo de vista a minha verdade. Pensei que o Homem era o resumo dos homens, da mesma forma que a Pedra era o resumo das pedras. Confundi catedral e soma de pedras e, a pouco e pouco, a herança foi-se desvanecendo. Urge restaurar o Homem. É ele a essência da minha cultura. É ele a chave da minha comunidade. É ele o princípio da minha vitória.»

(…)

«É muito cómodo basear a ordem de uma sociedade na submissão de cada um dos seus componentes a regras fixas. É bastante cómodo formar um homem que, além de cego, tolerasse sem protestar um mestre ou um Corão. Mas o resultado a atingir é de uma transcendência tal que, para libertar o homem, é pre¬ciso fazê-lo reinar sobre si próprio.»

(in: PILOTO DE GUERRA, edit Aster, 7ª ed.- Lisboa,)
                                   
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«- Adeus...
- Adeus — disse a raposa. — Vou-te contar o tal segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos...
- O essencial é invisível para os olhos — repetiu o principe-zinho, para nunca mais se esquecer.
- Foi o tempo que tu perdeste com a tua rosa que tornou a tua rosa tão importante.
- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... — repetiu o principezinho, para nunca mais se esquecer.
- Os homens já se esqueceram desta verdade — disse a raposa. — Mas tu não te deves esquecer dela. Ficas responsável para todo o sempre por aquilo que está preso a ti. Tu és respon¬sável pela tua rosa...
- Sou responsável pela minha rosa... — repetiu o principe¬zinho, para nunca mais se esquecer.»
(in: O PRINCIPEZINHO, ED. Caravela, Lisboa, s/d)




13.2.11

TEXTOS INESQUECÍVEIS


Antoine de Saint-Exupéry não é só O PRINCEPEZINHO.
Deixou obras magníficas que iluminaram o meado do século XX: CIDADELA, PILOTO DE GUERRA,
TERRA DOS HOMENS, UM SENTIDO PARA A VIDA.
Livros de intenso e luminoso humanismo, escritos entre duas guerras, por um homem que olhou o mundo com compaixão e compreensão profundas.
De vez em quando é bom conversar com ele.

(...)
"Porque, tal como acontece com a árvore, não podes saber seja o que for do homem se o desdobras pela sua duração e o destribuis pelas suas diferenças. A árvore não é semente, depois caule, depois tronco flexível, depois madeira morta. Para a conhecer é bom não a dividir. Á árvore é essa força que desposa a pouco e pouco o céu."
(...)
Antoine de Saint-Exupéry, in CIDADELA, ed. Aster, Lisboa, s/d

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[ NUMA VIAGEM DE COMBOIO ATRAVÉS DA POLÓNIA ]

E prossegui minha viagem entre esse povo cujo sono era turvo como um local de má fama. Flutuava um ru-mor vago, feito de roncos surdos, de obscuros lamentos, do raspar das botas no chão, quando eles, corpo dorido de um lado, experimentavam o outro...

E sempre, em surdina, esse inesgotável acompanhamento de seixos rolados pelo mar.
Sentei-me defronte de um casal. Entre o homem e a mulher, a criança, mal ou bem, conseguira anichar-se e dormia. Virou-se, no sono, e enxerguei seu rosto, sob a lamparina. Ah, que rosto adorável! Um fruto dourado havia nascido desse casal. Desses lerdos farrapos, nascera uma obra-prima de encanto e graça! Curvei-me para a sua fronte lisa e, vendo o doce trejeito da boca, disse para comigo: "Eis aqui um rosto de músico, eis aqui Mozart menino, eis aqui uma bela promessa de vida!" Os principezinhos das fábulas não seriam diferentes dele. Protegido, rodeado de carinho, educado, o que não poderia ele vir a ser? Quando por mutação nasce num jardim uma rosa nova, todos os jardineiros se emocionam. Isola-se a rosa, cultiva-se a rosa, conferem-se-lhe privilégios... Não existem, porém, jardineiros de homens. Mozart menino será marcado, como os outros, pela máquina trituradora. Mozart. Mozart quem sabe? frequentará os cafés-concertos e, desse fedor e dessa música apodrecida, fará uma das suas maiores alegrias. Mozart está condenado...

Voltei para o meu vagão. Disse para comigo: "Esta gente não sofre com o destino que tem. E não é caridade o que me está atormentando. Não se trata de me enternecer sobre uma chaga eternamente sangrando. Os que a sofrem não mais a sentem. E a espécie humana que aqui está ferida, lesada, e não o indivíduo. Não acredito na compaixão. Nesta noite, o que me atormenta é o ponto de vista do jardineiro. O que me está atormentando não é esta miséria, na qual, afinal de contas, é possível as pessoas instalarem-se tão bem quanto na preguiça. Gerações e gerações de orientais têm vivido na sujeira com prazer. O que me atormenta não é remediável com as sopas dos pobres. O que me atormenta não são estas corcundas nem esta fealdade. É que, em cada um destes homens, existe um pouco de um Mozart assassinado."

A. Saint-Exupéry, in UM SENTIDO PARA A VIDA, editORA Nova Fronteira, rIO DE jANEIRO, 1983

8.2.11

PARVOS?

Já se tornou um hino! Como todos os hinos é de uma simplicidade desconcertante. E acerta em cheio no alvo!



QUE PARVA QUE EU SOU - canção dos "DEOLINDA" que satiriza o desemprego

dos licenciados. O album ainda não saiu



Sou da geração sem remuneração
e não me incomoda esta condição.
Que parva que eu sou!
Porque isto está mal e vai continuar,
já é uma sorte eu poder estagiar.
Que parva que eu sou!
E fico a pensar,
que mundo tão parvo
onde para ser escravo é preciso estudar.

Sou da geração 'casinha dos pais',
se já tenho tudo, pra quê querer mais?
Que parva que eu sou
Filhos, maridos, estou sempre a adiar
e ainda me falta o carro pagar
Que parva que eu sou!
E fico a pensar,
que mundo tão parvo
onde para ser escravo é preciso estudar.

Sou da geração 'vou queixar-me pra quê?'
Há alguém bem pior do que eu na TV.
Que parva que eu sou!
Sou da geração 'eu já não posso mais!'
que esta situação dura há tempo demais
E parva não sou!
E fico a pensar,
que mundo tão parvo
onde para ser escravo é preciso estudar