27.11.06

Il est mort, le poète...








...mais uma razão para não perder a exposição que está na Galeria Perve, R. das Escolas Gerais, nº 17, Lisboa. Título: «Cesariny, Cruzeiro Seixas, fernando José Francisco e o passeio do cadáver-esquisito».

Mário Cesariny: por ele mesmo

Autografia

sou um homem
um poeta
uma máquina de passar vidro colorido
um copo uma pedra
uma pedra configurada
um avião que sobe levando-te nos seus braços
que atravessam agora o último glaciar da terra
o meu nome está farto de ser escrito na lista dos tiranos: condenado
à morte!

os dias e as noites deste século têm gritado tanto no meu peito que
existe nele uma árvore miraculada
tenho um pé que já deu a volta ao mundo
e a família na rua
um é loiro
outro moreno
e nunca se encontrarão
conheço a tua voz como os meus dedos
( antes de conhecer-te já eu te ia beijar a tua casa )
tenho um sol sobre a pleura
e toda a água do mar à minha espera
quando amo imito o movimento das marés
e os assassínios mais vulgares do ano
sou, por fora de mim, a minha gabardina
e eu o pico Everest
posso ser visto à noite na companhia de gente altamente suspeita
e nunca de dia a teus pés florindo a tua boca
porque tu és o dia porque tu és
a terra onde eu há milhares de anos vivo a parábola
do rei morto, do vento e da primavera
Quanto ao de toda a gente – tenho visto qualquer coisa
Viagens a Paris – já se arranjaram algumas.
Enlaces e divórcios de ocasião – não foram poucos.
Conversas com meteoros internacionais – também, já por cá passaram.
Eu sou, no sentido mais enérgico da palavra
uma carruagem de propulsão por hálito
os amigos que tive as mulheres que assombrei as ruas por onde
passei uma só vez
tudo isso vive em mim para uma história
de sentido ainda oculto
magnifica irreal
como uma povoação abandonada aos lobos
lapidar e seca
como uma linha-férrea ultrajada pelo tempo
é por isso que eu trago um certo peso extinto
nas costas
a servir de combustível
e é por isso que eu acho que as paisagens ainda hão-de vir a ser
escrupulosamente electrocutadas vivas
para não termos de atirá-las semi-mortas à linha
E para dizer-te tudo
dir-te-ei que aos meus vinte e cinco anos de existência solar estou
em franca ascensão para ti O Magnifico
na cama no espaço duma pedra em Lisboa-Os-Sustos
e que o homem-expedição de que não há notícias nos jornais
nem lágrimas à porta das famílias
sou eu meu bem sou eu
partido de manhã encontrado perdido entre
lagos de incêndio e o teu retrato grande!


In “Pena Capital”, Assírio e Alvim

O MAR DE UMA ROSA DE ESPUMA

O LUGAR ONDE de Novembro, no Badaladas, eatava para ser sobre o Surrealismo. Mudei de ideias por causa da proposta de Jaime Gama na Ass. República. Entretanto, neste fim-de-semana morreu Mário Cesariny...

Mas é preciso recordar que o Surrealismo não morreu. Em Portugal houve sempre um grande mal-entendido sobre esta palavra/conceito. Cruzeiro Seixas, felizmente ainda vivo e um dos nossos grandes surrealistas, disse há tempos numa entrevista:

"Em Portugal, na Assembleia da República, que devia ser um lugar de ciência e de conhecimento, os senhores deputados quando querem referir-se a um caso disparatado dizem: « Isso é surrealista»; na sua ignorância, julgam que surrealismo é sinónimo de disparate; não sabem que é uma filosofia".in "Apeadeiro 04/05", revista de atitudes literárias, inverno de 2004, ed. Quasi.
´
Mais adiante o entrevistador pergunta:

"Quando de um coração faz irromper uma asa, na sua dialéctica artística, procura traduzir o sonho para além do mundo terreno?"

E ele responde:

"São imagens poéticas. Tal como o poeta também o pintor vive de imagens. E são as imagens que me mantêm a flutuar neste mundo, de contrário já tinha ido ao fundo. `qualquer coisa que acrescentamos sempre à desesperança, a tal asa... O homem é insatisfação. nem o amor sublime calou a ânsia de sonhar."

Regresso muitas vezes a essa longa entrevista porque ela é uma imensa janela sobre outros mundos que mal sonhamos.

Aprendi com Cesariny que poesia e pintura se completam. E que ambas são lava do mesmo vulcão da vida, irredutível às explicações, necessárias mas nunca suficientes, da Razão. Como escreveu Pascal: "O destino da razão é ver que há muitas coisas que vão mais além do que ela".

André Breton, o homem chave do Surrealismo em França, explicou:

«Tudo induz a acreditar que existe certo ponto do espírito em que a vida e a morte, o real e o imaginário, o passado e o futuro, o comunicável e o incomunicável, o alto e o baixo cessem de ser percebidos contraditoriamente. Em vão se deve procurar outro móbil à actividade surrealista, que a esperança de determinar esse ponto.»

O surrealismo é uma filosofia. Mais: é uma actitude perante a vida. É inconformismo, desprezo pelos bonzos que querem domesticar a humanidade, espírito libertário, afirmação extrema de individualismo temperada pela consciência de que todos estamos no mesmo barco.
Por isso o processo dito do "cadáver esquisito" é uma forma de criação / expressão colectiva composta pela soma de muitas partes individuais: cada artista (pintor, poeta da escrita...) acrescenta algo a uma obra que vai sendo feita por todos, sem que haja uma concepção inicial previamente conhecida por todos, só têm de dar continuidade.


Só no final da vida Mário Cesariny teve o reconhecimento devido, mas era por já estar velho, já não ser perigoso. O surrealismo incomodou politicamente muita gente - e ainda incomoda. E até faz rir ouvir agoraCavaco Silva falar da "perda de um grande homem da nossa cultura"...


Transcrevo a dedicatória de Mário Cesariny a Cruzeiro Seixas numa exposição que este fez em África:

"Queria de ti um pais de bondade e de bruma
Queria de ti o mar de uma rosa de espuma."

21.11.06

AQUILINO RIBEIRO: o escritor de Novembro no BADALADAS


Aquilino Ribeiro

















A Casa Grande de Romarigães


AQUILINO RIBEIRO NO PANTEÃO NACIONAL

Quem foi este homem? Merece tamanha honra?

Os restos mortais do escritor Aquilino Ribeiro devem ser trasladados para o Panteão nacional – propôs, há duas semanas, o Presidente da Assembleia da República, Jaime Gama.

Para as novas gerações talvez este nome já diga pouco. No entanto ele é um dos grandes escritores portugueses. Depois de Camilo C. Branco e de Eça de Queiroz, não houve mais nenhum que tão bem soubesse dominar a Língua Portuguesa, pela capacidade plástica e expressiva, pela riqueza vocabular, pela variedade de construção, pelo recurso à saborosíssima oralidade popular que ele bebeu desde a infância na Beira Alta onde nasceu. A sua pena laboriosíssima – 50 anos de vida literária, com romances, novelas, contos, memórias, traduções e muito mais – fixou em páginas inesquecíveis todos os tipos humanos do povo, os pobres e esquecidos do progresso, que se afirmam pela tenacidade e pela manha, habituados às condições duríssimas da vida serrana ou da sorte adversa nas mais diversas paragens.
Aquilino Ribeiro foi acusado de “escritor difícil” porque usava muitos termos caídos em desuso no falar urbano – e talvez se encontre aqui a causa de algum esquecimento a que foi votado. Aos acusadores lembrava que, a esses termos regionalistas, os ouvia do povo nas aldeias. E que, perante uma palavra desconhecida, o bom leitor tira pelo sentido e passa adiante.
Dele ficou a imagem do escritor que não se refugiou na secretária. Lutou contra a monarquia e contra a ditadura do Estado Novo, correu riscos, foi preso, exilou-se. Cinco anos antes de morrer ainda publicou “Quando os Lobos Uivam”, romance em que denunciou a florestação forçada dos baldios, até aí secular fonte de lenha e pastorícia dos povos serranos. O governo de Salazar perseguiu-o e ele respondeu, intrépido, com um opúsculo exemplar de desassombro, intitulado “Quando os Lobos julgam, a Justiça uiva”. Só não foi a julgamento devido ao levantamento nacional e internacional que se organizou em sua defesa.
Parece-nos, pois, que a iniciativa de Jaime Gama, propondo a inumação dos restos mortais de Aquilino Ribeiro no Panteão Nacional de Santa Engrácia, é justíssima e só pecará por tardia.
JMD


Aquilino Ribeiro: Biografia

Aquilino Ribeiro nasce a 13 de Setembro de 1885 em Carregal, concelho de Sernancelhe. Aos dez anos, vai residir com os pais para Soutosa, onde faz a instrução primária. Transita depois para Lamego e Viseu, onde chega a frequentar o seminário, abandonando-o por falta de vocação. Em 1906 muda-se para Lisboa e, em pleno período de agitação republicana, começa a escrever os primeiros artigos em jornais. Em 1907, devido à explosão de uma bomba, é preso. Mas consegue evadir-se e, entre 1908 e 1914, divide a sua residência entre Paris e Berlim. Em 1914, com a eclosão da I Grande Guerra, volta a Portugal. Em 1918 publica o primeiro romance, "A Vida Sinuosa". A convite de Raul Proença, entra em 1919 para a Biblioteca Nacional. A partir desse ano, escreve incessantemente: "Terras do Demo" (1919), "O Romance da Raposa" (1924), "Andam Faunos Pelos Bosques" (1926), "A Batalha Sem Fim" (1931) e muitos outros títulos. Envolvido em revoltas contra a ditadura militar, no Porto e em Viseu, exila-se por duas vezes em Paris, onde casa pela segunda vez (a primeira mulher falecera). A partir de 1935 o seu labor literário torna-se mais fecundo: "Volfrâmio" (1944), "O Arcanjo Negro" (1947), "O Malhadinhas" (1949), "A Casa Grande de Romarigães" (1957), "Quando os Lobos Uivam" (1958), este último apreendido pela censura e pretexto para um processo em tribunal. Entretanto, viaja: Brasil, Londres, Paris. Em 1960 o seu nome foi proposto para o Prémio Nobel da Literatura. Três anos depois, durante as comemorações do 50° aniversário do seu primeiro livro – promovidas pela Sociedade Portuguesa de Escritores, então presidida por Ferreira de Castro – adoece inesperadamente. Morre a 7 de Maio de 1963, no Hospital da CUF, com 78 anos.



A História da Casa Grande
Aquilino Ribeiro, no prefácio que escreveu para o romance "A Casa Grande de Romarigães" – uma das suas obras mais lidas, inspirada num velho solar do alto Minho que ainda hoje pode ser visitado –, explica em que é que se baseou:

"Quando se procedeu ao restauro da Casa Grande, que foi solar dos Meneses e Montenegros, houve que demolir paredes de côvado e meio de bitola em que há um século lavrava a ruína, ocasionando-lhes fendas por onde entravam os andorinhões de asas abertas e desníveis com tal bojo que a derrocada parecia por horas. Num armário, não maior que o nicho dum santo, embutido na ombreira da janela, que a portada, em geral aberta, dissimulava atrás de si, encontrou-se uma volumosa rima de papéis velhos. (…) Não posso ver um farrapo impresso que não se me sobressalte a curiosidade. Com avidez fui tirando para fora cartapácios sem frontispício e sem índice, entre os quais um Mestre de Vida que ostentava uma dactiloscopia densa e salivosa, com os cantos das folhas tenazmente arrebitados, avisos e recibos da contribuição predial, uma resma de bulas da Santa Cruzada de pinto e de doze vinténs, receitas de botica, algumas traindo pelo sebo e a usura terem sido aviadas amiúde, folhinhas de anos sucessivos, e uns cadernos de papel almaço em que me palpitou matéria de bisbilhotice. Um deles, (...)foi o “Livro que há-de servir ao assentamento das cisas notáveis que assucederem na Casa Grande de Romarigães, também chamada Quinta de Nossa Senhora do Emparo. Com um epítome da origem, fundação, sítio e nobilíssima árvore de seus morgados, pelo Padre Sebastião Mendrugo, da Casa Cachada, e seu capelão. Ano da Graça de 1680". (…)"O outro manuscrito, em letra especiosamente torneada, chamava-se Vida de D. Luís António de Antas e Meneses, sargento-mor de Milícias e procurador às Cortes de 1828. Ao que se depreendia do estilo, abundante em ciência heráldica e genealógica, era obra dum linhagista do Alto Minho, tão amigo de Deus e do rei como inimigo dos malhados, o senhor Manuel Afonso, de Venade":

Para concluir, Aquilino refere que nunca pretendeu realizar um romance, mas sim uma monografia. E sai-se com uma frase que exemplifica o humor que percorre muitas das suas páginas: "Se me saiu romance, aconteceu-me a mesma coisa que a um triste e tosco carpinteiro dos meus sítios, de quem toda a gente zombava, decerto por milagre desenfadado do Espírito Santo: estava a fazer um gamelo para o cão e saiu-lhe uma viola”.


O ESCRITOR BEIRÃO

Até ao fim de uma vida intensamente vivida, Aquilino Ribeiro manteve-se ligado ao universo rural da Beira Alta, onde nasceu, cresceu e se tornou (de acordo com as suas palavras) «são e escorreito de corpo e espírito». Nem a permanência, alguns anos, em Paris nem meio século de Lisboa o afastaram das origens, homem da serra dos pés à cabeça, por dentro e por fora, «sem febre nem desejos metafísicos, como o mais néscio e regalão dos regalões». (Abóboras no Telhado.) Deixou o livro de memórias Um Escritor Confessa-Se. Todavia, a infância e a adolescência na Beira Alta revivem, com mais pitoresco e nitidez, nos romances Cinco Réis de Gente, Uma Luz ao longe e Via Sinuosa. O mesmo cenário se depara, por exemplo, nas Terras do Demo e na Estrada de Santiago, em cuja primeira edição surgiu a novela O Malhadinhas, um dos pontos mais altos da criação literária de Aquilino.
No entanto, Aquilino Ribeiro condensou muito mais elementos em que se conjugam a geografia, a história e a antropologia numa série de livros que costumo chamar «o quinteto da Beira Alta»: Os Avós dos Nossos Avós (l943); Aldeia (l946); Geografia Sentimental (l95l); Arcas Encoiradas (l953), e O Homem da Nave (l954). Aqui se depara tudo quanto define os usos e tradições dos habitantes da serra desde épocas remotas até às primeiras décadas deste século, quando se abrem estradas e se introduzem meios de transporte que vão do caminho-de-ferro até ao automóvel. Testemunho deste quotidiano era o Malhadinhas, o almocreve que se incumbira de estabelecer as comunicações entre o interior e o litoral, o campo e a cidade, levando e trazendo muitos produtos essenciais do comércio regional. (Texto do jornalista António Valdemar)

O que dele disseram alguns

“Conheci Aquilino Ribeiro, de quem me prezo de ter sido amigo e de quem continuo, cada vez mais, com o passar dos anos e as sucessivas leituras, rendido admirador." (Mário Soares)

"A força plástica e musical do mundo aquiliniano é admirável.A serra portuguesa, a aldeia patriarcal, o rebanho transumante, vivem nos seus livros como a vida flamenga e holandesa nos quadros dos grandes pintores dos Países Baixos." (Vitorino Nemésio)

“É a única personalidade literária da República que hoje podemos pôr ao par (e também em condigna oposição a) Fernando Pessoa.” (Óscar Lopes)

"É um inimigo do Regime. Dir-lhe-á mal de mim; mas não importa: é um grande escritor." (António de Oliveira Salazar)



18.11.06

Espaços de silêncio


A graciosidade, um certo ar ingénuo...










A monumentalidade serena, o equilíbrio...


Por vezes sinto necessidade de recuperar o socrático conceito de "oração": «conhece-te!»

Não se trata de alinhar em celebrações colectivas - para as quais sempre me senti pouco atraído - mas de entrar em espaços consagrados pelo homem para a reflexão, o silêncio.

Uma mesquita... ...uma capelinha, algures no Alentejo...

15.11.06

VIDA ESCANGALHADA


A vida pode estar complicada mas enquanto não acontecer uma catástrofe nada está perdido.

E, mesmo que aconteça, ainda podemos rir...

Carpe Diem!!

9.11.06

José Gil: "QUEM SE IMPORTA COM OS PROFESSORES?"

Acabo de ler o artigo de José Gil na VISÃO de hoje, com este título.
Chamo a atenção para ele. Felizmente aparece alguém prestigiado, a dizer o que, sendo óbvio, se tornou "politicamente incorrecto": os professores trabalham! E muito!
Mas o que está na moda é dizer mal dos professores.
Pessoas que não conseguem "controlar" em casa um miúdo de cinco anos, arrogam-se o direito de atacar quem tem de trabalhar com dezenas de crianças e jovens todos os dias.
Pessoas que não conseguem motivar um filho para ajudar em casa, não percebem o trabalho dos professores que procuram todos os dias motivar dezenas de jovens para aprendizagens difíceis.
Pessoas que não pegam num livro para estudar um assunto qualquer, que vivem numa constante preguiça mental, desvalorizam o trabalho dos professores que lutam quase sozinhos contra a incultura geral, contra o vazio de valores e de saberes em que se tornou a Televisão, contra o consumismo desenfreado em que se atolam mais as suas criancinhas.
Pessoas que não têm tempo para amar os filhos, ou que os estragam com privilégios absurdos, esperam dos professores que estes sejam capazes de restaurar as personalidades deformadas das crianças.
Aos vinte e três anos tive uma entrevista num Banco e era só dizer que sim para iniciar uma carreira bancária. Como muitos colegas meus que já estão reformados há anos e a receber o dobro do que ganho. Não quis e escolhi o ensino. Jamais me arrependi.
Em cada manhã penso: e se, em vez de ir ao encontro dos jovens que me esperam, eu tivesse de caminhar para a agência bancária, passar o dia a manipular dinheiro, cheques, promissórias, vales, financiamentos, etc.?
E os jovens lá estão. Custa-lhes, porque o esforço custa. Mas se eu estiver alegre, eles ficam alegres. Se eu me esforçar, eles esforçam-se. Todos os anos faço dezenas de amigos.
O que me custa agora é ver, ao fim de trinta e cinco anos de carreira, uma equipa do Ministério da Educação que ultraja os professores com um tratamento absolutamente injusto, revoltante.
E que essa equipa não reconheça o meu trabalho e contribua para o agravamento das condições em que se realiza.
Ninguém ignora que a incultura geral dos portugueses tende a desvalorizar a escola e que o insucesso escolar, em grande parte, tem origem aqui. Pois o ME não encontra melhor saída para esse problema do que tratar os professores como se fossem um bando de inúteis.
Espero pelo futuro com impaciência. Porque esta equipa do ME será desalojada - mas as escolas continuarão, com seus jovens e seus professores.

8.11.06

RUBEM ALVES: vale a pena (re) descobri-lo








"Enquanto a sociedade feliz não chega, que haja pelo menos fragmentos de futuro em que a alegria é servida como sacramento, para que as crianças aprendam que o mundo pode ser diferente. Que a escola, ela mesma, seja um fragmento do futuro..." (Rubem Alves)

Rubem Alves nasceu no dia 15 de Setembro de 1933, em Boa Esperança, sul de Minas Gerais, naquele tempo chamada de Dores da Boa Esperança. A cidade é conhecida pela serra imortalizada por Lamartine Babo e Francisco Alves na música "Serra da Boa Esperança".A família mudou-se para o Rio de Janeiro, em 1945, onde, apesar de matriculado num bom colégio, sofria com a chacota de seus colegas que não perdoavam o seu sotaque mineiro. Buscou refúgio na religião, pois vivia solitário, sem amigos. Teve aulas de piano.
Foi bem sucedido no estudo de teologia e iniciou a carreira como pastor no interior de Minas. No período de 1953 a 1957 estudou Teologia no Seminário Presbiteriano de Campinas (SP), tendo-se transferido para Lavras (MG), em 1958, onde exerceu as funções de pastor naquela comunidade até 1963.
Casou-se em 1959 e teve três filhos: Sérgio (1959), Marcos (1962) e Raquel (1975), sendo esta a inspiradora na feitura de contos infantis.Em 1963 foi estudar para Nova York, retornando ao Brasil no mês de Maio de 1964 com o título de Mestre em Teologia pelo Union Theological Seminary. Denunciado pelas autoridades da Igreja Presbiteriana como subversivo, em 1968, foi perseguido pelo regime militar.
Abandonou a igreja presbiteriana e regressou com a família para os Estados Unidos, fugindo das ameaças que recebia. Torna-se Doutor em Filosofia (Ph.D.) pelo Princeton Theological Seminary. A tese de doutoramento em teologia, “A Theology of Human Hope”, publicada em 1969 pela editora católica Corpus Books é, no seu entendimento, “um dos primeiros brotos daquilo que posteriormente recebeu o nome de Teologia da Libertação”. De volta ao Brasil, por indicação do professor Paul Singer, conhecido economista, é contratado para dar aulas de Filosofia na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Rio Claro (SP).
Em 1971, foi professor-visitante no Union Theological Seminary.Em 1973, transferiu-se para a Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, como professor-adjunto na Faculdade de Educação. No ano seguinte, 1974, ocupa o cargo de professor-titular de Filosofia no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), na UNICAMP. É nomeado professor-titular na Faculdade de Educação da UNICAMP e, em 1979, professor livre-docente no IFCH daquela universidade. Convidado pela "Nobel Fundation", profere conferência intitulada "The Quest for Peace".Na Universidade Estadual de Campinas foi eleito representante dos professores titulares junto ao Conselho Universitário, no período de 1980 a 1985, Diretor da Assessoria de Relações Internacionais de 1985 a 1988 e Diretor da Assessoria Especial para Assuntos de Ensino de 1983 a 1985.
No início da década de 80 torna-se psicanalista pela Sociedade Paulista de Psicanálise.Em 1988, foi professor-visitante na Universidade de Birmingham, Inglaterra. Posteriormente, a convite da "Rockefeller Fundation" fez "residência" no "Bellagio Study Center", Itália.
Na literatura, sobretudo na poesia, encontrou a alegria que o manteve vivo nas horas más por que passou. Admirador de Adélia Prado, Guimarães Rosa, Manoel de Barros, Octávio Paz, Saramago, Nietzsche, T. S. Eliot, Camus, Santo Agostinho, Borges e Fernando Pessoa, entre outros, tornou-se autor de inúmeros livros, é colaborador em diversos jornais e revistas com crónicas de grande sucesso, em especial entre os vestibulandos.
Afirma que é “psicanalista, embora heterodoxo”, pois acredita que no mais profundo do inconsciente mora a beleza. Após se aposentar tornou-se proprietário de um restaurante na cidade de Campinas, onde deu vazão ao seu amor pela cozinha. No local eram também ministrados cursos sobre cinema, pintura e literatura, além de contar com um óptimo trio com música ao vivo, sempre contando com “canjas” de alunos da Faculdade de Música da UNICAMP.
O autor é membro da Academia Campinense de Letras, professor-emérito da Unicamp e cidadão-honorário de Campinas, onde recebeu a medalha Carlos Gomes de contribuição à cultura.


Ver na net:
A casa de Rubem Alves


Projeto Releituras — Todos os direitos reservados. O Projeto Releituras — um sítio sem fins lucrativos — tem como objetivo divulgar trabalhos de escritores nacionais e estrangeiros, buscando, sempre que possível, seu lado humorístico,satírico ou irônico. Aguardamos dos amigos leitores críticas, comentários e sugestões. A todos, muito obrigado. Arnaldo Nogueira Júnior. ® @njo



COMO CONHECI ESTE AUTOR:

Um pequeno folheto da ASA deu-me a chave desta porta:

" Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma forma continuamos a viver naqueles cujos olhos aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa palavra. O professor, assim, não morre jamais..." (Rubem Alves)


Vamos (re) descobri-lo?


2.11.06

ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTE: uma questão gravíssima

O que se está a passar com o Estatuto da Carreira Docente é muito grave. O Ministério da Educação propõe a criação de dois tipos de professor dentro das escolas.
Se essa distinção correspondesse a conteúdos funcionais diferentes, entender-se-ia a proposta. ( Ex: Os professores de tipo A vão fazer as tarefas 1,2,3,4. Os de tipo B vão fazer as tarefas 5,6,7,8.)
Mas as escolas não funcionam (nem é possível que venham a funcionar!) assim. Porquê?
Porque todos os professores têm que realizar a tarefa nº 1: ministrar aulas. Se o não fizerem é porque não são professores. Um professor, por definição, dá aulas. Esse é o seu trabalho. Essa é parte de 60% do seu dia, sendo o restante a preparação e a avaliação dos alunos fora da aula.
Claro, há outras tarefas: ser Director de Turma (na minha escola há cerca de 90 professores e 27 turmas. Portanto só pode haver 27 Directores de Turma). Ser Coordenador de Departamento e de Grupos de trabalho ( em número variável, conforme o modo como a escola se organiza). Ser membro dos órgãos de gestão.
Ora parece justo que, sendo estas as tarefas supranumerárias em relação às aulas, a haver distinção entre professores, ela deve ser feita pagando tais tarefas quando e enquanto são cumpridas. Quando o não forem, não se pagam.
Isto já eu aceitava pois, de facto, há professores que trabalham muito dentro das escolas e outros nem tanto. Mas isso é assim porque há trabalhos diferentes a fazer, como exemplifiquei acima. E há rotatividade para não castigar sempre os mesmos.
Para as realizar, o professor tem de fazer formação? Que faça. Mas, à partida não se pode dizer que na escola tal há 27 Directores de Turma, (sempre os mesmos), e mais X Coordenadores, mais X na gestão, etc. Isso não faz sentido porque todas as tarefas são, por definição, rotativas, não há cargos vitalícios, eles fazem parte do ser professor, são extensões naturais da docência.
Claro que deve fazer-se a avaliação de todo este trabalho! Mas se ela não tem sido bem feitaaté agora é porque o Ministério da Educação nunca a regulamentou, tal como lhe era exigido pelo actual Estatuto da Carreira Docente.
Isto que parece evidente para quem trabalha na escola há 35 anos ( sim, sou professor há trinta e cinco anos!), não o é para o ME e 1º Ministro. Porquê?
Estou à espera desde o início que o Ministério da Educação apresente, juntamente com o "seu" ECD, o modelo correspondente de organização de escola. Essa era a sua obrigação, para percebermos a bondade da sua proposta para o sucesso escolar dos alunos. Mas não o faz. Porque sabe que esse ECD é impraticável. Deixa para um futuro Ministro de Educação a tarefa de realizar a quadratura do círculo.
Então aquela gente é destituída de inteligência?
Não o creio. São apenas obstinados que seguem cegamente a orientação do seu Primeiro que manda cortar despesas. E els cortam. Cegamente. Quem vier atrás há-de fechar a porta.
O que se está a passar é, de facto, muito grave!