22.3.07

DIA MUNDIAL DA POESIA

Com a devida vénia trancrevo este "post" de uma blogue que vale a pena seguir com atenção:DE RERUM NATURA ( Sobre a natureza das coisas).
Neste dia, 21 de Março, dá-se por terminado o Inverno e inaugura-se a Primavera. É um dia de simbologias várias que remetem para promessas de renascimento. É também o dia mundial da poesia. Esta justaposição pode sugerir que a poesia está em renascimento ou, melhor, em constante renascimento. Contudo, esta sugestão não convive bem com uma pergunta que se insinua por aí: para que serve a poesia?Estranha pergunta esta! Mas mais estranho é ter passado a ser corrente e haver sempre alguém disposto a ensaiar uma resposta. Mais estranho, ainda, é emergir dentro da Escola e, com toda a naturalidade, aí se ter instalado. E, muitíssimo mais estranho é ter deixado de soar estranha.Sem sobressaltos intelectuais, aceita-se a lógica do “saber em acção ou em uso”, da “mobilização de competências no quotidiano”, que se tem fixado nos sistemas educativos ocidentais na transição do século XX para o XXI. Sob o pretexto de democratização, de igualitarismo social, pretende-se preparar os alunos para resolverem problemas concretos do dia-a-dia com significado na sua vivência e para a sua vivência. Nesta lógica utilitarista e imediatista, temos de admiti-lo, a poesia não serve para nada! Coerentemente, seria de esperar que se esfumasse dos currículos. Mas, não é bem assim: é quase pior!Se deitarmos um olhar atento para o currículo nacional, programas e manuais do primeiro ciclo do ensino básico, ciclo absolutamente fundamental em termos de aquisição e consolidação de aprendizagens essenciais, percebemos várias coisas muito interessantes e… preocupantes.Percebemos que a poesia ocupa, nesses documentos, um lugar obscuro, porque disperso entre várias outras intenções educativas, e residual, porque é preciso algum esforço de observação para se perceber que está lá.Percebemos que a poesia caiu nas estranhas malhas do relativismo cultural. Nos manuais, em particular, os textos de escritores com estatura universal, rareiam porque remetem, alega-se, para uma educação elitista, e quando estão presentes são postos ao mesmo nível de escritores de dotes literários mais do que duvidosos. Manuais de Língua Portuguesa há, que só têm ou têm essencialmente “poesia” do próprio autor do manual, que (felizmente) ninguém sabe quem é.Percebemos que a poesia é usada como estratégia pretensamente pedagógica, à maneira de receita, destinada a resolver os males do mundo: para sensibilizar as crianças para o multiculturalismo, explora-se um certo poema; para as sensibilizar para questões de género, aquele outro; para se tornarem defensores do ambiente ou da paz, não podem deixar de ler e dramatizar os que são recomendados; para adquirem hábitos de alimentação saudável, há um que, certamente, resulta; e assim por diante…Percebemos que a poesia tem dias marcados e há poesia marcada para vários dia: uma para comemorar o dia do pai e, claro, outra para comemorar o dia da mãe e outra, ainda, para comemorar o dia dos avós, essa invenção mais recente; duas ou três para celebrar o Natal, como convém, por ser época festiva alargada; uma para assinalar o dia da árvore; outra para afirmar o dia da mulher e mais outra para sublinhar o dia da criança; várias para festejar o dos namorados, porque para esse dia há muitas.Percebemos que a poesia deve “respeitar o vocabulário que as crianças trazem de casa”. Assim, se não for simplista, adapta-se: extraem-se cirurgicamente as palavras que se supõe que os alunos nunca escutaram antes, que não se usam no seu contexto de origem, pois o confronto com uma palavra menos comum, além de ser uma afronta à sua condição, desinteressa-os. Nessa adaptação também é comum reduzir-se a poesia em tamanho, porque, como se vai dizendo, o tempo de atenção e de esforço que os alunos conseguem dirigir para um texto é cada vez mais reduzido e facilmente se desmotivam quando confrontados com mais do que meia dúzia de linhas.Percebemos que a poesia é decorativa e ilustrativa, ganhando muitas vezes o carácter de recompensa: nos manuais aparece com frequência no fim de cada lição, de cada tema, uma quadra, uma lengalenga, um trava-línguas para rematar o assunto. Não, parece ali caber qualquer orientação, deixando-se o texto desamparado, entregue apenas e só à criança. Mas, também acontece exactamente o contrário: ser a poesia acompanhada de explicações do sentido, de questionários interpretativos, roubando-se-lhe o prazer da leitura e sufocando ou condicionando a sua imaginação.Ora bem, ainda que ninguém saiba como se leva alguém a amar a poesia, sabe-se que há caminhos que não se devem percorrer e, estranhamente, é nalguns desses caminhos que andamos a insistir. Nada melhor do que um poeta para nos fazer ver isso:

Ver claro

Toda a poesia é luminosa, até
a mais obscura.O leitor é que tem às vezes,
em lugar de sol, nevoeiro dentro de si.
E o nevoeiro nunca deixa ver claro.
Se regressar outra vez e outra vez
e outra vez
a essas sílabas acesas
ficará cego de tanta claridade.
Abençoado seja se lá chegar.

Eugénio de Andrade in "Os Sulcos da Sede"

21.3.07

CAMINHO


«Como se comporta o teu guia interior?
Tudo reside aí. O resto, dependa ou não do teu livre arbítrio, não passa de cadáver e fumo.»
Marco Aurélio, Pensamentos para mim próprio.


19.3.07

UM CAIXADÒCLOS NO REINO DA DINAMARCA




Alexandre O’Neill nasceu em Lisboa a 19 de Dezembro de 1924. A mãe era de ascendência aristocrata e nortenha e o pai provinha de antigos senhores irlandeses, caídos em desgraça e chegados a Portugal nos séc. XVIII. Na parede da sala da casa paterna havia um retrato de Salazar, figura venerada da classe média lisboeta, temerosa dos tumultos sociais. O filho perdeu a paciência para estas coisas e talvez aqui tenham origem a radical ironia e o sarcasmo mordaz com que fustigou as fraquezas do país em que nasceu e que ele, simbolicamente apelidou de «Reino da Dinamarca» para despistar a PIDE. Isso não o livrou de ser preso como opositor ao regime, apesar do seu feitio independente e boémio que nunca lhe permitiu uma militância política organizada.
Alexandre O’Neill foi um dos fundadores do Grupo Surrealista de Lisboa, em 1947, juntamente com Mário Cesariny, José-Augusto França e outros. Avesso a regimentos e princípios de escola, absorveu deste movimento artístico o gosto para a inventiva verbal, as associações de ideias e de palavras em jogos inesperados, surpreendentes.
A sua poesia é marcada pela visão irónica e gozada das pessoas e das coisas, por vezes satírica, servida por um poderoso sentido da observação mas humanizada por intenso e, por vezes, terno lirismo.
As suas “Poesias Completas” foram reunidas em 2005 num grosso volume de 540 páginas pela editora Assírio & Alvim, obra essencial para quem goste de ter uma visão ampla da moderna literatura portuguesa. Ali se juntaram os livros anteriormente publicados: Tempo de Fantasmas (1951); No Reino da Dinamarca ( 1958); Abandono Vigiado ( 1960); Poemas Com Endereço ( 1962); Feira Cabisbaixa ( 1965 ); De Ombro na Ombreira ( 1969 ); Entre a Cortina e a Vidraça ( 1972 ); A Saca de Orelhas ( 1979 ); As Horas Já de Números Vestidas ( 1981 ); Dezanove Poemas ( 1983 ), além de alguns dispersos. Morreu em 21 de Agosto de 1986, em Lisboa.

Nota: uma obra a ler para quem quiser conhecer melhor este escritor: “ Alexandre O’Neill – Uma biografia literária”, Maria Antónia Oliveira, Lisboa, Dom Quixote, 2007.





PAÍS SEMPRE ADIADO

Portugal foi, para o poeta Alexandre O’Neill, o lugar da sua dor: país adiado, videirinho, do “chacun que s’arranje!” – enquanto a Europa enfunava velas e já ia no mar alto. Satirizou: «País engravatado todo o ano / e a assoar-se na gravata por engano». Foi à procura desse país, para lhe tirar o retrato em palavras certeiras.



PELO ALTO ALENTEJO
In: Entre a Cortina e a Vidraça

Os homens desertaram destas terras.
Só um bacoco, a rufiar com a sombra,
só um bacoco, bolsado das tabernas,
em sete palmos, só, se reencontra.


Turistas fotografam cal e pedras:
o cubismo de casas e ruelas.
Nas soleiras sobraram umas velhas.
Escorre-lhes o preto pelas canelas.

Num caixote com rodas, meigo tolo,
- um que não veio, aos esses, lá das Franças,
passar com os velhotes as vacanças –
preso a um fio de cuspo, vende jogo.

Eu e a Teresa procuramos queijo.
O melhor que se traz do Alentejo.




PAÍS DISTRAÍDO

Vicente Jorge Silva, in: “PÚBLICA”, 18 /8/1996: « É talvez o poeta português moderno mais cruelmente injustiçado, mais esquecido e menos lido nos dias que correm – ele que foi um dos maiores inventores de palavras, paradoxos, trocadilhos e construções poéticas originais que este país deu à luz. (...)”
Alexandre O’Neill olhou-se e viu os outros; e nos outros viu-se a si próprio.

CAIXADÒCLOS
In: Feira Cabisbaixa
- Patriazinha iletrada, que sabes tu de mim?
- Que és o esticalarica que se vê.
- Público em geral, acaso o meu nome...
- Vai mas é vender banha de cobra!...
- Lisboa, meu berço, tu que me conheces...
- Este é dos que fala sozinho na rua...
- Campdòrique, então, não dizes nada?
- Ai tão silvatávares que ele vem hoje!
- Rua do Jasmim, anda, diz que sim!
- É o do terceiro, nunca tem dinheiro...
- Ó Gaspar Simões, conte-lhes Você...
- Dos dois ou três nomes que o surrealismo...
- Ah. agora sim, fazem-me justiça!
- Olha o caixadòclos todo satisfeito
a ler as notícias...


PAÍS DO MODO FUNCIONÁRIO DE VIVER

O’Neill tinha 25 anos quando conheceu Nora Mitrani, francesa que veio a Lisboa fazer uma conferência sobre o Surrealismo. Apaixonam-se e o poeta decide ir ter com ela a Paris. Alarmado, um familiar faz uma denúncia para a PIDE, tentando impedir a partida. É chamado ao inspector Seixas. Fica proibido de sair de Portugal e só depois do 25 de Abril conseguiria obter passaporte. Enojado com a PIDE e com o país que a consentia, escreveu um dos poemas mais pungentes da poesia portuguesa, dedicado à mulher amada. Por ser longo extraímos alguns excertos:

UM ADEUS PORTUGUÊS
In: No Reino da Dinamarca

Nos teus olhos altamente perigosos
vigora ainda o mais rigoroso amor
a luz de ombros puros e a sombra
de uma angústia já purificada

Não tu não podias ficar presa comigo
à roda em que apodreço
apodrecemos
a esta pata ensanguentada que vacila
quase medita
e avança mugindo pelo túnel
de uma velha dor

Não podias ficar nesta cadeira
onde passo o dia burocrático
o dia-a-dia da miséria
que sobe aos olhos vem às mãos
aos sorrisos
ao amor mal soletrado
à estupidez ao desespero sem boca
ao medo perfilado
à alegria sonâmbula à vírgula maníaca
do modo funcionário de viver

(...)
Não podias ficar presa comigo
à pequena dor que cada um de nós
traz docemente pela mão
a esta pequena dor à portuguesa
tão mansa quase vegetal

(...)
Nesta curva tão terna e lancinante
que vai ser que já é o teu desaparecimento
digo-te adeus
e como um adolescente
tropeço de ternura
por ti.

__________________________________________________________________




Morreu João da Cruz Ramos, o poeta pastor


Perdi muito do que tinha,
Já fui tudo e serei nada;
A minha alma adivinha
Que a vida a que chamo minha
Foi-me apenas emprestada.

Em Março de 2003 esta página LUGAR ONDE foi dedicada. àquele a quem chamei “o guardador de poemas” e que os conterrâneos conheciam por “Palhinhas”. « Homem de poucas letras mas de rara sensibilidade literária» - escrevi então. Faleceu no início deste Março, no lugar onde sempre viveu, Casal da Junqueira, entre Bonabal e Coutada, «sítio de serena e belíssima paisagem». Aqui o recordamos com saudade. Adeus “Palhinhas”. E obrigado por tantos versos que nos cantaste.

18.3.07

PROGRAMA DE VIDA



Posted by Picasa
Senhor que a minha vida seja permitir a infância
embora nunca mais eu saiba como ela se diz
( Ruy Belo )

17.3.07

V I A G E N S . . .






Quantos barcos nos esperam?

Março já vai alto...





A PRIMAVERA
O pássaro chegou
e com ele a luz:
de cada trilo seu
nasce a água.
E entre água e luz que o ar desata
está a Primavera inaugurada já,
sabe a semente que já cresceu,
na corola desenha-se a raiz,
abrem-se por fim as pálpebras do pólen.
Tudo isto fez um simples pássaro
no alto dum verde ramo.
Pablo Neruda, Plenos Poderes, Public Dom Quixote, Lx , 1982

12.3.07

Praia de Santa Rita







Santa Rita, no litoral norte de Torres Vedras, estava assim ontem, ao fim da tarde.

E foi Camões que escreveu:

«Tomai-me, bravos mares;
Tomai-me vós, pois outrem me deixou»

Ele lá sabia...

10.3.07

Interior...Exterior

Do silêncio interior do Claustro românico da Sé Velha de Coimbra... ao sol que ilumina a Nazaré.

Andei por lá hoje.




























7.3.07

ALEXANDRE O' NEILL: "de ombro na ombreira"...






Ando de volta do Alexandre O'Neill. "POESIAS COMPLETAS", Ed. Assírio & Alvim. O pretexto é a belíssima "biografia literária" escrita por Maria Antónia Oliveira e publicada pela Dom Quixote já este ano (1ª ed.: Janeiro 2007)



CAIXADÒCLOS

- Patriazinha iletrada, que sabes tu de mim?
- Que és o esticalarica que se vê.

- Público em geral, acaso o meu nome...
- Vai mas é vender banha de cobra!...

- Lisboa, meu berço, tu que me conheces...
- Este é dos que fala sozinho na rua...

- Campdòrique, então, não dizes nada?
- Ai tão silvatávares que ele vem hoje!

- Rua do Jasmim, anda, diz que sim!
- É o do terceiro, nunca tem dinheiro...

- Ó Gaspar Simões, conte-lhes Você...
- Dos dois ou três nomes que o surrealismo...

- Ah. agora sim, fazem-me justiça!

- Olha o caixadòclos todo satisfeito
a ler as notícias...


HÁ PALAVRAS QUE NOS BEIJAM

Há palavras que no beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.

Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas, inesperadas
Como a poesia ou o amor.

( O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado )

Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.

4.3.07

PERMITIR A INFÂNCIA... Sempre Ruy Belo!




Uma criança brincando com a água. Recordei o poema de Ruy Belo:





ALGUMAS PROPOSIÇÕES COM CRIANÇAS


A criança está completamente imersa na infância
a criança não sabe que há-de fazer da infância
a criança coincide com a infância
a criança deixa-se invadir pela infância como pelo sono
deixa cair a cabeça e voga na infância
a criança mergulha na infância como no mar
a infância é o elemento da criança como a água
é o elemento próprio do peixe
a criança não sabe que pertence à terra
a sabedoria da criança é não saber que morre
a criança morre na adolescência
Se foste criança diz-me a cor do teu país
Eu te digo que o meu era da cor do bibe
e tinha o tamanho de um pau de giz
Naquele tempo tudo acontecia pela primeira vez
Ainda hoje trago os cheiros no nariz
Senhor que a minha vida seja permitir a infância
embora nunca mais eu saiba como ela se diz

Ruy Belo, in: Homem de Palavra(s)
















AINDA A TASCA DO VENCESLAU






Encontrei a fotografia perdida! Andava misturada no meio de livros, CD's, revistas. O costume.


Aqui fica a tasca do Venceslau que hoje já só existe na nossa memória.

Para que não esqueça...

26.2.07

Um filme comovente







Entrei pela madrugada com «Diários de Che Guevara». Não tenho palavras. Pedi-as emprestadas a quem tão bem (d) escreveu este filme belísssimo:








DIÁRIOS DE CHE GUEVARA


Deixa o mundo mudar-te, e podes mudar o mundo!


«Diários de Che Guevara», que teve a sua estreia mundial em 2004, no Festival de Sundance, onde foi recebido com uma ovação em pé por parte dos espectadores, segue duas pessoas quando estas descobrem a rica e complexa topografia social e humana do continente americano latino. Em 1952, dois jovens argentinos, Ernesto Guevara (Gael García Bernal) e Alberto Granado (Rodrigo de la Serna), partiram numa viagem de estrada para descobrir a verdadeira América Latina. Ernesto é jovem de 23 anos estudante de medicina especialista em leprologia, e Alberto, de 29 anos, é bio-químico. Com um romântico sentido de aventura, os dois amigos deixam os seus confortáveis ambientes familiares em Buenos Aires em cima da motocicleta de Alberto, uma 1939 Norton 500, que recebe a alcunha "La Poderosa". Embora a motocicleta se avarie durante a sua jornada, eles continuam com recurso à boleia. À medida que se afastam cada vez mais da familiar e confortável Buenos Aires, os dois amigos tornam-se próximos como irmãos, unidos pela crença no progresso e no que a ciência e a medicina podem fazer pela região. Começam a conhecer uma diferente América Latina, através das pessoas que encontram na estrada, ao mesmo tempo que a variada geografia que encontram, de montanhas a desertos, de complacentes ricos a pessoas de pobreza extrema, começa a reflectir as suas próprias perspectivas em mudança. De mineiros sem casa a prostitutas de barco, de vítimas de lepra a pessoas prósperas, Ernesto e Alberto descobrem uma afinidade para a humanidade neles, e uma determinação para mudar o mundo. Durante a viagem de 8 meses e 8 mil quilómetros, partindo da Argentina, seguindo através dos Andes para o Chile, passando pelo deserto de Atacama para o Peru, em direcção a uma colónia de leprosos, até chegar à Venezuela, eles sobem às alturas de Machu Picchu, onde as majestosas ruínas e o extraordinário significado da herança Inca, destruída pelos invasores espanhóis, lhes causa um profundo impacto. Quando chegam à colónia de lepra de San Pablo, localizada nas profundezas da Amazónia peruana, os dois jovens começam a questionar o valor do progresso que é definido por sistemas económicos que deixam tantas pessoas na pobreza extrema e as oprime. As suas experiências na colónia despertam neles os homens que eles irão tornar-se mais tarde, ao definir a jornada política e ética que vão seguir nas suas vidas.





«OS DIÁRIOS DE CHE GUEVARA»

Belíssimo exemplo da viagem iniciática que deixa uma marca indelével na alma dos viajantes. Contornando o comercialmente aproveitador e erróneo título português, chegamos a um filme que conta a odisseia de Alberto e Ernesto através da América do Sul, maioritariamente feita na motocicleta que de poderosa só a ironia tinha. Contada com enorme sensibilidade humana (o desenvolvimento da amizade entre os dois e a consciência social larvar) e cromática (excelente a fotografia de Eric Gautier - e que paisagens recorta), esta história revela o estado das coisas numa América Latina artificialmente dividida pela política e pelos estratos sociais. São muito injustas algumas leituras do filme à luz de preconceitos políticos alicerçados na figura que se viria a tornar o Ernesto Guevara deste filme (o Che); leituras essas que, na minha opinião, turvam a visão daquilo que esta fita tem de essencial e que não é nada de panfletário. Mas ao contrário de muitas opiniões, considero este um filme altamente político. Não o serão todos os verdadeiros grandes filmes? Que outra forma igualmente potente existe de ser político do que ir ao âmago da consciência humana? Os actores têm um óptimo desempenho: se Garcia Bernal se cimenta como estrela latina maior da Meca do cinema, Rodrigo de la Serna é uma deliciosa revelação como o amigo Alberto Granado (de quem vislumbramos o rosto real na actualidade no final do filme - e os olhos que misturam desencanto com uma réstea de utopia). Referência final para o extraordinário epílogo a preto e branco condensando os retratos humanos daquela América sofredora, nitidamente influenciado pelo trabalho fotográfico de Sebastião Salgado.

Jorge Silva avidanaoeumsonho.blogspot.com




24.2.07

Vítor-Luís Grilo: novo livro






Intitula-se MEMÓRIA DE AGOSTO. Lançamento na Cooperativa de Comunicação e Cultura, hoje, às 17.30 H. Livrinho pequeno no formato mas com poemas intensos. Vítor dedica-o à memória de Ana Maria, sua mulher, que morreu repentinamente em Agosto de 2005.



TU FOSTE O INÍCIO

Ao sentir
penso em ti
e nas limpas madrugadas.
Tu foste o início.
Em ti se concentraram
palavras urgentes,
como trabalho ou vida.
A murta e o orégão
perfumam a casa.
Em sons de afecto escuto o vento.
À noite.


Acordar com um poema na cabeça...

Acontece! Abrir os olhos, de manhã e correr a procurar o poema que um dia se leu e ficou num desvão da memória. Com a Sophia este fenómeno é recorrente. Encontrei:

BRISA

Que branca mão na brisa se despede?
Que palavra de amor
A noite de Maio em si recebe e perde?

Desenha-te o luar como uma estátua
Que no tempo não fica

Quem poderá deter
O instante que não pára de morrer?








Vermeer conseguiu captar esse instante...

23.2.07

Zeca Afonso - Memórias de um artista cidadão

A minha pequena homenagem ao Zeca.

Zeca Afonso morreu há vinte anos.




Já passaram 20 anos! Recordo o funeral, em Setúbal, com uma enorme multidão e a nossa certeza de que o mundo iria ficar mais frio, mais pobre.

Com a devida vénia, transcrevo ( e subscrevo! ) as palavras de "O Jumento", sobre José Afonso:

Pelos seu sonhos e utopias porque vivemos tempos em que deixou de haver espaço para sonhar, as ideologias implodiram e a grandeza dos projectos políticos é medida pela reacção do PSI20. Talvez os tempos sejam outros, talvez a esquerda do Zeca tenha dado lugar a uma outra que é tanto melhor quanto mais eficaz for a aplicar o que a direita não conseguiria implementar, talvez o mundo já não seja o do Zeca Afonso, mas esse mesmo mundo está carente da generosidade, da ética, do desinteresse de muitos homens do tempo do Zeca, de muitos que estavam ao seu lado e de outros tantos que partilhando muitos dos seus valores estariam do outro lado.

Concorde-se ou não com as suas utopias, Zeca Afonso deixou-nos um legado de grandeza humana, de generosidade e de ética política que à medida que o país se dissolve na pequenez de muitos dos que se diz serem a classe política se agiganta cada vez mais. Para além de um grande poeta cantor, Zeca Afonso foi um dos grandes homens do seu tempo, um tempo em que havia homens grandes.

Tenho saudades do Zeca Afonso, da liberdade de sonhar, do prazer de se poder ter utopias, dum país onde os valores eram mais importantes que a percentagem do PIB que viaja no avião do primeiro-ministro e onde havia mais igualdade por maiores que fossem as desigualdades.

21.2.07

Vale mais tarde...

Pela primeira vez: Praia do Castelejo, no concelho de Vila do Bispo (Algarve), já na costa vicentina, litoral oeste. A foto não diz o quão belo é o lugar.

E o peixe fresco no restaurantezinho lá do sítio?
E os amigos que lá me levaram?


15.2.07

SOPAS DE PEDRA




É uma iniciativa do Arquivo Municipal e do Museu Municipal Leonel Trindade. A ideia é reunir à volta de um jantar nos Claustros do Convento da Graça pessoas interessadas nos assuntos que se anunciam:

Dia 9 de Março: «Águas limpas...Águas sujas»

Dia 16 de Março: «A simbologia monumental da água»

Dia 23 de Março: «O chafariz dos Canos»

Em cada dia estará presente um convidado que fará uma exposição inicial.

Inscrições no Arquivo Municipal. 10 € / refeição. Inscrição para os três jantares: 25 €.

Ninguém me encomendou a publicidade. Mas como acho que vale a pena...

OS MENINOS DA AVÓ

É o título de um blogue que tem a paixão da divulgação de boa literatura. Sediado em Sintra, organiza encontros sobre autores e textos literários.
Um dia destes faço-me convidado.

Transcrevo um belo texto de Vinícius de Morais, que dedico aos amigos que por aqui passam:


Procura-se um amigo

Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimentos, basta ter coração.
Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto, dos ventos e das canções da brisa. Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor. Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo. Deve guardar segredo sem se sacrificar.

Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é preciso que seja puro, nem que seja todo impuro, mas não deve ser vulgar. Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objectivo deve ser o de amigo. Deve sentir pena das pessoas tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve gostar de crianças e lastimar as que não puderam nascer.

Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos, que se comova, quando chamado de amigo. Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grandes chuvas e das recordações de infância. Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer, para contar o que se viu de belo e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade. Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, de beira de estrada, de mato depois da chuva, de se deitar no capim.

Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é bela, mas porque já se tem um amigo. Precisa-se de um amigo para se parar de chorar. Para não se viver debruçado no passado em busca de memórias perdidas. Que nos bata nos ombros sorrindo ou chorando, mas que nos chame de amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive.

Vinicious de Moraes

OS GUARDADORES DO TEMPO







António Augusto Sales escreveu uma magnífica crónica sobre a vida cultural de uma pequena cidade de província ao longo do séculos XIX e XX, Torres Vedras. Propunha-se abordar apenas a história do teatro amador mas a consulta exaustiva da imprensa local e documentação avulsa fê-lo alargar o horizonte. O resultado é este livro que é o oposto dos ( por vezes...) enfadonhos ensaios históricos para especialistas. A.A. Sales escreve como um repórter de rua que dá conta de uma fantástica viagem no tempo. Ele esteve lá e narra o que viu!

A edição, lançada em Janeiro de 2007, é da Câmara Municipal de Torres Vedras e faz parte da colectânea "H - Linhas de Torres", constituída por estudos sobre a História torriense. Este já é o número 8 da colecção, a não perder por quem gosta de História Local. E que belo título: OS GUARDADORES DO TEMPO.

14.2.07

AINDA O MARCELO ... salvo seja.

Houve quem não gostasse do que escrevi há tempos sobre o Conselheiro de Estado Marcelo Rebelo de Sousa.
Então leia este pedaço de prosa que saíu há dias no jornal «Público», da autoria da Helena Matos. Parece que há mais gente a ficar farta daquela "banha da cobra" que ele vende semanalmente na televisão pública...


«Depois de termos sobrevivido à desilusão de percebermos que a saudade não é um exclusivo nacional, que não existem linces na Malcata e que já nem somos os únicos a cozinhar bacalhau, consola-nos descobrir que temos um novo ícone da singularidade lusa: o professor Marcelo. Como bem se percebe, o professor Marcelo nada tem a ver com o cidadão Marcelo Rebelo de Sousa. O professor Marcelo não é uma pessoa. É um posto. Os romanos, povo de sentido indiscutivelmente prático - quem senão eles poderia chamar Primeiro, Segundo ou Terceiro aos filhos? -, acharam por bem criar um cargo que, à falta de mais pacífica designação, adquiriu o nome de quem o ocupava. Falo obviamente dos césares. Portugal não é o Império Romano, logo não falamos de césares e pretorianos mas sim do que disse o professor Marcelo, essa espécie de holograma que ora nos narra tudo o que fez nos últimos sete dias - e esse tudo implica pelo menos um concerto na Baviera e uma palestra em terras de Basto, uma aula sobre Direito em Luanda, três pareceres, duas apresentações de livros e um jogo de futebol - ora nos enreda nas voltas e contravoltas do seu raciocínio tão narcísico quanto hiperactivo. Nas palavras do professor Marcelo os crimes não têm pena e o "não" passa a "sim". Mas nada disto importa porque o professor Marcelo usa as palavras como outros deitam cartas. Mais do que o explicador de Portugal ao povo e às crianças, ele é o grande ilusionista da nação.» [Público]

12.2.07

A TASCA DO VENCESLAU




A começar pelo nome: era uma tasca a sério.Cheirava a óleo de fritar, tinha balcão corrido, barris com o preço do vinho marcado a giz. Vinha sempre alguém lá de dentro a enxugar as mãos ao avental. Havia pratinhos sobre o balcão com petiscos caseiros.
Noutra fase mais adiantada chegou a vender fruta, que sabia a quintal regado com água de poço velho.
Tinha cartões para perfurar, o último furo dava direito a bola de futebol ou garrafa de brandy manhoso. Pelo caminho iam saindo espelhos de bolso, canivetes, lapiseiras...
O tinto era bom mas o branco era sempre "especial". Puro ou traçadinho de gasosa, empurrão ideal para sandes de coiratos ou jaquinzinho com molho à espanhola.

Estava fechada há anos. Mas a construção lembrava ainda como era aquela rua no início do século: casa térrea, telhado já abaulado pelas vigas empenadas, ervas entre as telhas, cantarias grossas.
Ainda tínhamos a vaga esperança de que alguém pegasse naquilo - nem nos importávamos que pusesse balcões novos de alumínio e fórmica.

Mas foi abaixo. Uma manhã destas corropiavam por lá uns camiões pesados que levavam o que uma feia máquina escavadora lhes despejava no dorso. A tasca do Venceslau desaparecia às carradas.

Há-de nascer ali mais um hino à construção civil, o "Venceslau Building", por exemplo, para irmanar com o "Serpa Pinto Plaza" e o "Edifício Twins", tudo made in Torres Vedras, perdão, Old Towers City...



- Ó Alzira, sai uma elegia com molho de escabeche!!!


ELEGIA POR UMA TASCA

Mágoas curtiste muitas
E desalentos tamanhos
afogados em penaltes de tinto
Ali à beira dos passantes
tão fácil entrar e pedir
- “um copo de três!”

Tanta vez consolaste
Tristezas insolúveis
Porém dissolvidas nos taninos
Oportunamente emborcados
Em desespero de causa.

Tasca taberna
santuário de dor
e de euforia

Muito mais eu diria
Se pudesse ainda
Entrar-te,
ó tasca do Venceslau !

11.2.07

O BARRETE

Está na rua.
Pode-se perguntar: que tem a ver a Associação para a Defesa e Divulgação do Património Cultural de Torres Vedras com estas brincadeiras?

Tem muito a ver. O Carnaval é uma tradição antiga - e saudável! - em Torres Vedras. E um dos aspectos mais significativos é a participação de TODOS nessa festa. A ideia é não haver espectáculos encomendados, textos oficiais, brasileirices para chamar gente. Há que defender os espaços alternativos e a criatividade vinda de todos os lados e tendências. A ideia de criar uma revista de humor como O BARRETE foi a de oferecer a tal alternativa à revista "oficial" da Comissão de Carnaval. Onde fosse possível criticar, brincar com...,sobretudo com os autarcas. Claro, respeitamos o seu trabalho numa perspectiva de cidadania, mas não o sacralizamos. E achamos saudável criticar.

(Queria colocar a imagem da capa mas os "donos" do servidor andam distraídos. Talvez amanhã...)

Já percebi porque não aparecia a imagem: parece que tem "megas" a mais.
Sai imagem a preto e branco!!


RECORDAR FERNANDO ASSIS PACHECO

Na Casa Fernando Pessoa, a Campo de Ourique. Francisco José Viegas, seu director, organizou um ciclo de encontros sobre F. Assis Pacheco. Justificou:

«Não poderíamos esquecê-lo porque era uma das nossas vozes. Sobretudo neste mês em que se festejaria o seu 70º aniversário. Por isso a Casa Fernando Pessoa reúne os seus amigos e leitores para assinalar a data - justamente Campo de Ourique, o bairro onde viveu e um dos lugares da sua poesia.Não se trata de uma comemoração, porque F. A.Pacheco havia de detestá-la. Coisa mais informal, mais a gosto de quem gosta de falar, de ouvir - e de ler a sua poesia ou de recordar a s suas histórias.»





A imagem, irreverente, vem publicada no livro póstumo editado pela Assírio & Alvim RESPIRAÇÃO ASSISTIDA,Lisboa,, 2003 - cinco anos depois da morte do poeta.

Mas lembrar o poeta é, sobretudo, ler a sua poesia.

SONETOS
2.

Os trabalhos de amor são os mais leves
de quantos algum dia pratiquei
na cama as alegrias fazem lei
e se me queixo é só de serem breves

eu vivo atado às tuas mãos suaves
num nó de que este corpo já não sai
ferve o arco do sol a tarde cai
ardem voando pelo céu as aves

mágoas outrora muitas fabriquei
e em países salobros jornadeei
ao dorso das tristezas almocreves

a vez em que te amei um outro fui
comigo fiz a paz nada mais dói
e os trabalhos de amor nunca são graves

Fernando Assis Pacheco


O ciclo prossegue no dia 15 de Fevereiro, 21h30, com a presença de Fernando J.B. Martinho, Abel Barros Baptista e Pedro Tamen. A 26 de Fevereiro estarão presentes José Carlos de Vasconcelos e Rogério Rodrigues. A leitura de poemas será regra em todos os encontros.
No fim - oh! simpatia - bebe-se um tinto especial. F. Assis Pacheco era um homem de copos demorados e solidários.

Estive lá, com alguns bons amigos.Nunca tinha entrado na Casa Fernando Pessoa. Agradabilíssima surpresa. Foi toda recosnstruída, mantendo-se apenas o espaço onde era o quarto de F. P. e onde se guarda ainda a sua máquina de escrever e a célebre cómoda onde escreveu "O Guardador de Rebanhos". O resto é um conjunto de espaços amplos com biblioteca, sala de conferências e salas de exposições. Na Rua Coelho da Rocha, nº 16.

6.2.07

ABBÉ PIERRE

O Dº Notícias publicou um artigo sobre o Abbé Pierre que vale a pena ler. Autor: O P. Anselmo Borges.

Numa época de radicalismos catolicistas acantonados no movimento NÃO (referendo sobre a despenalização do aborto ), ler este artigo é uma lufada de ar fresco e a garantia de que a inteligência está viva entre os crentes.
Não resisto a transcrever uma parte:


O abbé Pierre era há muito a figura mais popular entre os franceses. A França pôs luto pela sua morte. A missa do funeral foi transmitida pela televisão e à última homenagem compareceram o Presidente, o primeiro-ministro e praticamente todo o Governo.

Nasceu em 1912 em Lyon. Aos 19 anos, entrou nos Franciscanos Capuchinhos. Durante a ocupação nazi, viveu na clandestinidade, ajudando judeus e resistentes. Foi deputado de 1945 a 1950. Criou em 1949 a primeira comunidade Emaús, ao serviço dos sem-abrigo e dos mais desfavorecidos - o termo faz alusão ao passo do Evangelho que narra a aparição de Cristo ressuscitado aos dois peregrinos de Emaús, que o acolheram em casa. A partir de 1971, o movimento alcançou dimensão planetária - os Companheiros de Emaús actuam em 40 países.

Com a guerra, a França ficou devastada. Se a partir de 1952 o crescimento económico se acelerou extraordinariamente, as desigualdades eram profundas no plano social e notórias sobretudo ao nível do alojamento. O Inverno de 1954 foi particularmente duro, tendo sido nesse contexto que o abbé Pierre lançou o famoso apelo radiofónico de 1 de Fevereiro a favor dos sem-abrigo, que desencadearia o que chamou uma "insurreição da bondade". Nos centros de acolhimento, lia-se: "Tu que sofres, sejas quem fores, entra, dorme, come, retoma a esperança, aqui, és amado."

Era um padre de oração e de acção a favor dos pobres e da dignidade. Dele disse o Presidente francês: "Representará sempre o espírito de revolta contra a miséria, o sofrimento, a injustiça, e a força da solidariedade."

Era um homem de espírito livre e crítico, mesmo no domínio da fé. No seu último livro, Meu Deus, Porquê?, ousa perguntar a Deus até quando vai durar esta tragédia do incrível sofrimento humano. Declara que a concepção expiatória da morte de Cristo é "horrível", pois levou também ao dolorismo, "uma abominação e uma caricatura da vida cristã". Depois de confessar que teve relações sexuais com mulheres, embora "de forma passageira", coloca "a questão crucial para a Igreja do casamento dos padres e da ordenação de homens casados", esperando que Bento XVI permita a comunhão aos católicos divorciados recasados. Porque não utilizar a palavra "aliança" para os casais homossexuais, que "viveram frequentemente o seu amor na exclusão e na clandestinidade"? A ordenação das mulheres é "muito provável" e "desejável".

Considerava "absurdo" que Deus apenas se revelasse e salvasse a pequeníssima parte da humanidade constituída pelos baptizados. Nada permite afirmar que o inferno existe. Defensor da laicidade, opunha-se ao regime de "cristandade" e pensava que "o papado reflecte ainda o rosto do papa-imperador", sendo necessário "libertar a Igreja da tutela romana sobre todas as Igrejas locais". Lembrando as "cruzadas" e os seus efeitos, alertou para o perigo de "responder à terrível provocação dos terroristas da Al-Qaeda com uma nova cruzada".

Admirador de Teilhard de Chardin, que soube reconciliar a visão cristã com a teoria evolucionista, sonhava com a capacidade da Teologia para reler e reinterpretar, por exemplo, a doutrina do "pecado original" ou a "transubstanciação" - palavra "um pouco bárbara" -, a substituir por "Presença". Afinal, "as coisas últimas só em linguagem poética se podem dizer".

Tinha como lema: "Viver é aprender a amar", punha a compaixão "no cume das virtudes" e definia a morte como "o encontro com o Absoluto, o Eterno". Para ele, foi em 22 de Janeiro de 2007, aos 94 anos.

5.2.07

CAMINHAR

Um amigo desconhecido levou-me até algumas memórias longínquas. Caminhei através do labirinto e encontrei outros vestígios. Como esta canção que tentei juntar ao blogue. Consegui apenas uma ponte, para quem quiser atravessar.

Caminhando, vou aprendendo a comunicar...

YouTube - Georges Moustaki et Barbara - La dame brune

YouTube - Georges Moustaki et Barbara - La dame brune

4.2.07

HOMENAGEM

O meu dia começou da melhor maneira: alguém fez um comentário e eu corri a ler. Vinha de um blogue que recomendo vivamente: «http://fliscorno.blogspot.com/»

Lá encontrei o velho Georges Moustaki e duas das suas imortais criações.
Visitem e deliciem-se. Nos links para outros blogues encontrarão o ANTEROIZÓIDE" do "nosso" Antero Valério.
Como aperitivo aqui fica "Ma solitude".

Obrigado "Raposa Velha"!

PS. E já agora: não desista de alimentar o seu blogue. Pode não alterar o pobre país em que vivemos mas altera sua relação com ele; isto é: mantém-no vivo, atento, crítico. E a pouco e pouco isto vai mudando.
Veja o referendo: a campanha do "Não" parece uma coisa fossilizada, de outras eras. E há vinte anos não era assim...



MA SOLITUDE

Pour avoir si souvent dormi
Avec ma solitude
Je m'en suis fait presqu'une amie
Une douce habitude
Elle ne me quitte pas d'un pas
Fidèle comme une ombre
Elle m'a suivi ça et là
Aux quatre coins du monde

Non, je ne suis jamais seul
Avec ma solitude

Quand elle est au creux de mon lit
Elle prend toute la place
Et nous passons de longues nuits
Tous les deux face à face
Je ne sais vraiment pas jusqu'où
Ira cette complice
Faudra-t-il que j'y prenne goût
Ou que je réagisse?

Non, je ne suis jamais seul
Avec ma solitude

Par elle, j'ai autant appris
Que j'ai versé des larmes
Si parfois je la répudie
Jamais elle ne désarme
Et si je préfère l'amour
D'une autre courtisane
Elle sera à mon dernier jour
Ma dernière compagne

Non, je ne suis jamais seul
Avec ma solitude
Non, je ne suis jamais seul
Avec ma solitude

31.1.07

A NOVA TERMINOLOGIA ...

Vasco Graça Moura publicou hoje no Diário de Notícias mais um artigo sobre a famigerada "TLEBS" (a nova terminologia gramatical proposta para o Ensino) . Aqui fica. Pela oportunidade e, também, porque me parece útil ampliar o seu raio de acção - por muito pequena que seja esta contribuição.




Caro professor de Português



Vasco Graça Moura
Escritor

Se perguntar alguma coisa ao Ministério da Educação quanto à vigência ou não vigência da TLEBS, de certeza que ninguém lhe dará uma resposta concreta... Está-se perante uma perniciosa pescadinha de rabo na boca. A TLEBS está em vigor, não estando. Ou não está em vigor, estando. Ontem, ia ser suspensa. Hoje, parece que só vai ser suspensa para o próximo ano lectivo e se pretende aplicá-la no que resta do ano corrente, não obstante as suas muitas e reconhecidas deficiências.

Simplesmente, esta aplicação, intercalar e provisória, não faz qualquer sentido, uma vez que não se trata apenas das falhas científicas de que a TLEBS enferma, mas também da impossibilidade prática de ensinar com base nela, mesmo com a melhor das boas vontades.

Por isso, é impossível considerar que exista uma obrigação de aplicá-la. O próprio ministério o reconhece, uma vez que já a suspendeu quanto aos manuais do 8.º ano, anuncia a intenção de suspendê-la globalmente para 2007/2008 e pretende seja efectuada uma revisão científica.

Mas... de que revisão estaremos a falar? No seu já célebre texto da Internet (http/jperes.no.sapo.pt), João de Andrade Peres escreve que "a discussão em torno da TLEBS só terá a ganhar se for claro e pacífico que é em primeiro lugar aos fonólogos, aos morfólogos, aos sintaxistas (...), aos semânticos, aos dialectólogos, aos historiadores da língua e a outros profissionais da Língua academicamente credenciados (...) que cabe a tarefa de analisar e discutir a validade científica de um produto que é eminentemente linguístico e, mais concretamente, gramatical", para além das questões emergentes de outros planos de análise, que requererão outros contributos.

Ora o ministério, que ainda não se apercebeu da extensão e da profundidade deste problema, limitou-se a incumbir duas pessoas desse trabalho, sendo altamente discutível e deontologicamente inaceitável a intervenção de uma delas por previsível conflito de interesses (marido de uma das autoras da TLEBS e consultor científico de uma gramática para o 3.º ciclo do básico e secundário, conforme à terminologia e publicada por uma editora comercial, a Lisboa Editora).

De tudo isto resulta que a TLEBS não está, nem estará tão cedo, em condições de ser utilizada: citando ainda o artigo referido, ela não conta com uma boa gramática de Português em que possa apoiar-se, é insensata pela sua extensão, apresenta um número impressionante de deficiências metodológicas, de erros de formulação e de erros conceptuais, pretendendo-se introduzi-la abruptamente e com total desprezo pela coesão intergeracional. Sem contar as discrepâncias e descoordenações entre o elenco terminológico constante da Portaria 1488/2004 e o material fornecido pela base de dados (esta, não fazendo parte da portaria, não tem aliás qualquer valor cominativo...).

Ora o meu caro professor não pode ser obrigado a ensinar o erro. E ainda menos pode ser obrigado a ensinar aquilo que não consegue entender, apesar da sua qualificação académica, de ter recebido formação para ser professor, de não ser intelectualmente destituído e de ter com certeza uma válida experiência do seu trabalho. O ministério, aliás, tem conhecimento da sua justificadíssima reacção negativa por um relatório de Setembro de 2006, em que se conclui pela rejeição generalizada da terminologia por parte dos docentes.

Por isso, venho apelar ao seu sentido de responsabilidade cívica, cultural e profissional. Recuse-se a aplicar a TLEBS! Nem sequer se tratará de desobediência civil que, aliás, sempre se justificaria, atentos o imperativo de defesa da nossa língua e as demais circunstâncias.

E também não se pode falar aqui de respeito da legalidade: Andrade Peres já demonstrou que os programas são ilegais porque violaram legislação vigente à data da sua homologação, atribuindo valor legal a um simples documento de trabalho, além de que a homologação dos programas do secundário não está publicada no jornal oficial.

No vazio instaurado, a si, caro professor, o que lhe resta é ir ensinando, provisoriamente, com base na Nomenclatura Gramatical Portuguesa de 1967 e na Gramática de Celso Cunha e Lindley-Cintra. Não serão perfeitas nem inteiramente satisfatórias, mas pelo menos não bloqueiam as suas possibilidades de se assumir a sério como professor de Português.

Até a TLEBS ser objecto de uma revisão decente, só resta um caminho: se o ministério se obstina em não repor a vigência da Nomenclatura, reponhamo-la nós!

24.1.07

O BARRETE 2007




A edição deste ano da revista O BARRETE está em preparação.
Trata-se de uma revista anual de humor, editada desde há 11 anos, na época do Carnaval, pela Associação para a Defesa e Divulgação do Património Cultural de Torres Vedras.

Vale a pena! Um barrete dos antigos que não chateia ninguém. Antes pelo contrário...
Onde se vende?
Nas principais livrarias de Torres Vedras.

22.1.07

A MINHA PÁTRIA É...





Andava há tempos à procura deste célebre texto de

Fernando Pessoa. Encontrei-o agora:

A minha pátria é a língua portuguesa
Fernando Pessoa


Não chóro por nada que a vida traga ou leve. Há porém paginas de prosa me teem feito chorar. Lembro-me, como do que estou vendo, da noute em que, ainda creança, li pela primeira vez numa selecta, o passo celebre de Vieira sobre o Rei Salomão, "Fabricou Salomão um palacio..." E fui lendo, até ao fim, tremulo, confuso; depois rompi em lagrimas felizes, como nenhuma felicidade real me fará chorar, como nenhuma tristeza da vida me fará imitar. Aquelle movimento hieratico da nossa clara lingua majestosa, aquelle exprimir das idéas nas palavras inevitaveis, correr de agua porque ha declive, aquelle assombro vocalico em que os sons são cores ideaes — tudo isso me toldou de instincto como uma grande emoção politica. E, disse, chorei; hoje, relembrando, ainda chóro. Não é — não — a saudade da infancia, de que não tenho saudades: é a saudade da emoção d´aquelle momento, a magua de não poder já ler pela primeira vez aquella grande certeza symphonica.
Não tenho sentimento nenhum politico ou social. Tenho, porém, num sentido, um alto sentimento patriotico. Minha patria é a lingua portuguesa. Nada me pesaria que invadissem ou tomassem Portugal, desde que não me incommodassem pessoalmente, Mas odeio, com odio verdadeiro, com o unico odio que sinto, não quem escreve mal portuguez, não quem não sabe syntaxe, não quem escreve em orthographia simplificada, mas a pagina mal escripta, como pessoa própria, a syntaxe errada, como gente em que se bata, a orthographia sem ípsilon, como escarro directo que me enoja independentemente de quem o cuspisse.
Sim, porque a orthographia também é gente. A palavra é completa vista e ouvida. E a gala da transliteração greco-romana veste-m´a do seu vero manto régio, pelo qual é senhora e rainha.
Texto publicado originariamente em "Descobrimento", revista de Cultura n.º 3, 1931, pp. 409-410, transcrito do "Livro do Desassossego", por Bernardo Soares (heterónimo de Fernando Pessoa), numa recolha de Maria Aliete Galhoz e Teresa Sobral Cunha; ed. de Jacinto do Prado Coelho, Lisboa, Ática, 1982 vol. I, p. 16-17. Respeitou-se a ortografia da época de Fernando Pessoa. — 25/02/2005
Sobre o Autor
1888-1935. Poeta português, nascido em Lisboa, considerado a maior figura literária do século XX, teve grande influência no chamado movimento futurista ou modernista. Colaborou em prosa e verso em várias publicações e dirigiu as revistas "Orfeu" e "Atena". Autor de "Mensagem", usou ainda heterónimos para várias obras suas: "Poesias" (Álvaro de Campos), "Poemas" (Alberto Caeiro) e "Odes" ( Ricardo Reis), além do "Livro do Desassossego" (Bernardo Soares).




21.1.07

ESTE PAPAGAIO NUNCA MAIS SE CALA




Não consigo levar a sério este homem. Foi líder político e não conseguiu mudar nada de substancial. Mas sabe falar de tudo. Tem opinião sobre tudo a mais umas botas. Analisa, critica, propõe, destrói, desconstrói... enfim... instrói que se farta.
Será legítimo um Conselheiro de Estado ( que ele é) usar a TV pública para se auto-promover e, de caminho, se for preciso, despromover todos aqueles com que não concorda?

19.1.07

Recordar o autor de "APARIÇÃO"





A Página deste mês no BADALADAS é sobre o grande escritor


VIRGÍLIO FERREIRA: interrogação sobre o destino humano

Em 1 de Abril de 1981 Virgílio Ferreira esteve em Torres Vedras, no Cine-Teatro Ferreira da Silva, para assistir à projecção e comentar o filme de Lauro António, Manhã Submersa, baseado no seu romance com o mesmo nome publicado em 1953. Quem lá esteve recorda o perfil austero, a frase rigorosa, o olhar penetrante. Recordamos um dos grandes escritores portugueses do século XX.

Nasceu em Melo (Serra da Estrela) em 1916 e faleceu na sua casa de Lisboa em 1996, de ataque cardíaco quando estava a escrever. Teve a morte que desejava, ele que em todos os seus livros assumiu como tema central o enigma da existência humana, o destino da humanidade, a solidão e o lugar do homem no mundo.
O seu livro mais conhecido é, talvez, Aparição, publicado em 1959. Sendo uma das obras de leitura aconselhada para os estudantes do E. Secundário, continua a despertar nestes um vivo interesse. É que a “aparição” refere-se a esse momento único da vida de todos os homens, quando tomam consciência de si-próprios e de que cada ser humano é “um fenómeno único que não se repete”. O acto de existir e a verificação de que essa existência é efémera motiva a angústia existencial e a interrogação. Virgílio Ferreira optou por se distanciar do romance neo-realista que se centrava na condição social do “homem explorado pelo homem” e afirmou o primado da individualidade e do destino humano face à desmedida dimensão do universo. Ler Virgílio Ferreira é procurar, com ele, as respostas ao enigma da existência humana. Por isso a sua obra continua tão actual.



OBRA VASTÍSSIMA

Virgílio Ferreira foi distinguido com os mais importantes prémios literários: da Associação Portuguesa de Escritores para o romance Até ao Fim (1988); Prémio Fémina para a tradução francesa de Manhã Submersa; do Pen Club, que o propôs para o Prémio Nobel; da Associação Internacional de Críticos Literários; do Município de Lisboa; Prémio D. Dinis da Casa de Mateus. E ainda Prémio Europália, em 1991 e o maior de todos: Prémio Camões, para o conjunto da obra.
Tem 22 obras de ficção. Num crescendo impressionante, publicou na parte final da sua vida aqueles que alguns consideram os seus romances mais tocantes: Para Sempre (1983); Até ao Fim ( 1987); Em Nome da Terra (1990); Na Tua Face ( 1993).
Escreveu mais de uma dezena de Ensaios de carácter filosófico, dentro da perspectiva da chamada “filosofia existencialista”. Destacamos: Invocação ao Meu Corpo ((1969); Espaço do Invisível (quatro tomos, de 1965 a 1987).
De 1980 a 1994 publicou 9 volumes do seu diário, em duas séries, o célebre conjunto com o título de “Conta-Corrente”. Em 2001 foi publicado Escrever, reflexões soltas sobre os mais diversos temas e que faziam parte do seu vasto espólio.





CITAÇÕES
( do livro ESCREVER)

O universo é infinito mas o homem é finito. E no entanto a infinitude é que é a medida do homem.

Amas ou não uma mulher, mas não sabes porquê. Como hás-de poder saber a razão do bem e do mal?

Há duas vozes no homem e aí se equilibra a História. Uma delas diz: ama o teu semelhante porque ele é teu irmão. E a outra diz: esmaga o teu semelhante porque ele é teu rival. Esta voz é a mais forte porque a parte de animal no homem é a mais poderosa.

15.1.07

A VIDA É UMA PERPÉTUA DESPEDIDA











ANTOLOGIA Poemas de despedida



Meditação do Duque de Gandia
sobre a morte de Isabel de Portugal

Nunca mais
A tua face será pura e viva
Nem o teu andar como onda fugitiva
Se poderá nos passos do tempo tecer.
E nunca mais darei ao tempo a minha vida.

Nunca mais servirei senhor que possa morrer.
A luz da tarde mostra-me os destroços
Do teu ser. Em breve a podridão
Beberá os teus olhos e os teus ossos
Tomando a tua mão na sua mão.

Nunca mais amarei quem não possa viver
Sempre,
Porque eu amei como se fossem eternos
A glória, a luz e o brilho do teu ser,
Amei-te em verdade e transparência
E nem sequer me resta a tua ausência,
És um rosto de nojo e negação
E eu fecho os olhos para te não ver.

Nunca mais servirei senhor que possa morrer.

(Sophia de Mello Breyner Andresen)

Este poema toma como referente a história ligada ao Duque de Gandia, futuro S. Francisco de Bórgia (1510-1572) que, depois de enviuvar de uma fidalga portuguesa, D. Leonor de Castro, se terá apaixonado pela esposa do rei de Espanha, a princesa D. Isabel de Portugal – que morreu muito nova.

==*==

Quando o último pássaro morrer
na última oliveira a ocidente
opõe o peito ao que acontecer
e levanta a cabeça dignamente

Despede-te da terra onde nascer
tu nascias enfim continuamente
repara no nascente e no poente
que muito em breve deixarás de ver

Não valem cinco pássaros apenas
dois asses e deus não os reconhece
no meio das demais coisas terrenas?

Levanta-te. Coragem coração
o espírito nas coisas comparece
aproxima-se a libertação
(Ruy Belo)

==*==

(...)
Chegou enfim o tempo do adeus
Oiço a canção efémera das coisas
despeço-me da terra da alegria
(...)
A despedida súbita do sol
despedida dos dias e estações
crepúsculo propício ao adeus
a esta vida frágil é que aspiro
triunfo sobre a vida fugitiva
ave entregada ao decisivo voo
pensamentos de terna nostalgia
jardim de harmoniosos pensamentos
dou-te de toda alma o nome da ausente
árvore em flor no bosque fonte no deserto
(Ruy Belo)

12.1.07








TEXTO OPORTUNO...

Estes gajos são uns macacões...

Não resisto a transcrever de "O JUMENTO" o texto que subscrevo por inteiro.
Falta vergonha a esta gente, de uma insensibilidade bruta, perante os milhares que diariamente vão para o desemprego...



BUSCA, BUSCA !!!

O mesmo ministro das Finanças que dia sim, dia não, inventa mais uma medida para tramar os funcionários públicos, desdobra-se em afirmações de que vai procurar uma solução para manter o ordenado do funcionário público mais bem pago da Europa. É uma pena que o ministro não gaste um único neurónio para procurar soluções para os que são mal pagos na Administração Pública. É caso para dizer-lhe "Busca, busca!".

Mas se o senhor ministro concorda que os sucessos do fisco se devem às manhas comunicacionais do Paulinho das Missas, que os aumentos das taxas do iva, ou a competência dos colaboradores que lhe dão as ideias e a quem ele nem tem a dignidade de agradecer, ou os vinte milhões de contos investidos por Ferreira Leite, ou a modernização implementada por Sousa Franco e o esforço e sentido de cidadania dos 13.000 funcionários da DGCI em nada contribuíram, então seja coerente, assuma que o dr. Macedo salvou o país, que é mais importante do que Cavaco e Sócrates juntos. Neste pressuposto a solução é fácil, basta ter a coragem de a assumir e propor, em vez de ser o vencimento do Paulinho das Feiras a estar indexado ao do primeiro-ministro deveria ser ao contrário, o vencimento de Sócrates é que não deve ser superior ao do apóstolo que a Opus Dei mandou para salvar o país, quanto ao vencimento do Presidente da República pouco importa, Cavaco Silva até já estava aposentado quando se candidatou.

É lamentável que Portugal tenha um ministro das Finanças que não saiba o que é um Estado laico e que depois de cortar os direitos a centenas de milhares de funcionários, muito dos quais tão competentes quanto o dr. Macedo, se preocupe tanto para manter um vencimento que nem o George Bush ganha! É lamentável que o ministro das Finanças não entenda quanto estas suas preocupações são ofensivas para a Função Pública e, em especial, para os 13.000 funcionários da DGCI.

9.1.07

O AUTOR DO MÊS NA BIBLIOTECA MUNICIPAL
Mircea Eliade (1907-1986)

Historiador e romancista Romeno, nasceu em Bucareste em 1907. Publicou extensivamente sobre a história das religiões. Depois da Segunda Guerra Mundial, passou a viver em Paris, e em 1958 aceitou a responsabilidade da cadeira de História das Religiões, na Universidade de Chicago, cargo que ocuparia até à sua morte, em 1986.Viveu em Portugal de 1940 a 1944. “Lisboa conquistou-me desde o primeiro dia…”
Um autor a re (ler), agora que as religiões estão de novo no cerne das questões políticas.




Um LUGAR ONDE...




Peniche, Ponta da Papoa: um lugar onde o vento sopra desabrido, as rochas navegam mar dentro e nós sentimos que Portugal ficou lá para trás.

Ali fui feliz pela integridade de SER com a Natureza.

Ali andei um dia com a minha filha, doente, amparando-a no desespero. Horas que deixaram marcas. Raízes do presente.

Um dia destes vou caminhar de novo na Papoa. Talvez ouça ainda os ecos de antigas horas. E o presente será mais intenso.

6.1.07

ATENÇÃO À BICA DO CHOUPAL !!!

Na leitura do Plano de Pormenor do Choupal, em discussão até final de Dezembro p.p., aapercebi-me de uma falha clamorosa: no Plano não se faz qualquer referência à "Bica do Choupal". No entanto trata-se de um chafariz antiquíssimo, medieval, que Madeira Torres refere claramente no seu "Descripção Histórica e Económica da Villa e Termo de Torres Vedras", pág. 73 da edição fac-simile da Misericórdia de Torres Vedras.

É uma falha grave, a denotar ignorância ou insensibilidade.

Há que ter isto em consideração. O que ali está é Património Histórico legítimo, memória de séculos. A sua não inclusão no Plano faz temer que, qualquer dia, quando se iniciarem as obras no Choupal, um qualquer maquinista de buldozer mete a máquina a direito, arrasa tudo e... o mal será irreparável. De nada valerão as desculpas posteriores, a fazerem lembrar o crime patrimonial que foi a destruição do Moinho do Gaio - nunca devidamente esclarecido, embora a opinião pública saiba bem quem foi o culpado e quem lhe deu cobertura...
Esta discussão do Plano do Choupal passou algo despercebida: é que a nossa Câmara Municipal entendeu que uma boa época para a fazer era, exactamente ... o Natal!
Há que estar atento. A Associação para a Defesa e Divulgação do Património Cultural de Torres Vedras já tomou posição e enviou o seu parecer. Muito crítico àcerca da questão da "Bica".
Mas também àcerca da projectada Biblioteca Municipal que ficará dentro do Choupal!
Ideia grandiosa, sim sehor! Mas alguém conhece estudos, inquéritos, estatísticas que mostrem que a actual Biblioteca - em serviço há apenas cerca de 12 anos! - está ultrapassada?
E alguém sabe os custos de um equipamento deste género, só para o ter aberto?
E mais não digo, por hoje...

2.1.07

ANO NOVO, COISAS VELHAS...



- Estamos no ar: 2007 !!! Segura aí !!!

- A verdade é que o voo não condiz com a bagagem...

- Estamos em Portugal, animal !!


De maneira que é assim...
Entramos em 2007, olhamos em redor e... parece tudo na mesma.
Vamos continuar a aturar o Soba da Madeira...
Continuamos a ver e ouvir o inenarrável Pinto da Carolina, mais - o que é pior! - a adoração que por ele têm os fanáticos do FCPorto...
Veremos ainda mil vezes o insuportável Major de Gondomar...
e mais a Fátima de Felgueiras...
e mais o outro palerma de VNGaia...
e mais uma Ministra da Educação que é tudo menos uma pessoa educada...

e mais um Sócrates que vai dizer pela enésima vez que a economia está a recuperar, enquanto tudo aumenta, os bancos rebentam de lucros, as fábricas fecham e centenas vão para o olho da rua...
e mais o Marques Mendes, em bicos dos pés, sem credibilidade para os do partido dele quanto mais para nós que nada temos a ver...

e os outros do PSD a fazerem leituras políticas de tudo e mais umas botas...
e os do PS a agarrarem-se aos tachos e às panelas...
e os do PCP a fingirem que a URSS nunca existiu, nem o equívoco histórico em que chafurdaram mais de 50 anos, e mais as certezas que têm àcerca de tudo...
e mais o Louçã a pregar às massas, também a fingir que é tudo a sério, sabendo muito bem que fala assim porque nunca estará no poder...

Estamos fartos! FARTOS!

E vocês, aí, estarão também fartos destas tretas que vou escrevendo por aqui.
É ! Às vezes apetece entrar numa caverna e ficar lá até toda a gente se esquecer...