“A Origem das Espécies”, publicado há 150 anos, é um dos grandes livros da Humanidade. Não é preciso ser-se cientista ou erudito para o ler e entender. As Publicações Europa-América editaram-no em 2005, com pequenos textos introdutórios e um vocabulário final, muito úteis. Vale a pena mergulhar nele para compreendermos melhor o mundo em que vivemos.
As grandes descobertas científicas normalmente desmentem o chamado “senso comum”. Parece que é o Sol que anda à volta da Terra – até que Galileu mostrou que era ao contrário. Parece que a Natureza é e sempre foi como a conhecemos – até que Darwin demonstrou que os nossos sentidos nos enganam: tudo muda (ideia que já era admitida no tempo dele), mas segundo um mecanismo que ninguém sabia qual era e que ele descobriu, após muitos anos de estudo: a “selecção natural”, uma ideia que, afinal, é bem simples. Parte de duas premissas: 1 - a quantidade de alimento disponível é normalmente inferior aos seres existentes; 2 - o meio ambiente altera-se devido a factores diversos. Consequência: os seres com mais hipóteses de sobrevivência são os que têm alguma característica vantajosa sobre os outros, e que lhes permite adaptarem-se melhor às condições envolventes. Essas características são transmitidas por hereditariedade. É este processo que, ao longo de períodos muito extensos de tempo, acaba por dar origem à evolução dos seres vivos, que têm origem comum.
Porque é que ninguém se lembrara disto antes? Darwin só lá chegou porque observou no terreno a correcção das novas teorias geológicas de Charles Lyell, seu contemporâneo. E estas teorias apontavam para uma idade da Terra que excedia em muitos milhões de anos o que até aí era admitido e que é condição necessária para a “selecção natural” – processo biológico que atravessa milhares de gerações.
Tal como já acontecera dois séculos antes com Galileu, as ideias de Darwin colidiam com leituras e interpretações simplistas da Bíblia. Daí o seu repúdio na época em que surgiram, manifestado ainda hoje em alguns meios conservadores dos Estados Unidos da América. Fenómenos de ignorância, que o são por teimarem em negar a Ciência e não quererem conhecer as circunstâncias históricas das religiões.
De 27 de Dezembro de 1831 a 2 de Outubro de 1836 Darwin fez a que foi talvez a viagem mais produtiva de toda a história da Ciência. Percurso: Plymouth (Inglaterra), Canárias, Cabo Verde, Brasil, Argentina, Chile, Ilhas Galápagos (no O. Pacífico), Austrália, O, Índico, África do Sul, Brasil, Açores e de novo Plymouth.
A ideia de transformação das espécies já fora defendida antes dele, sem apoio experimental, e gerara grandes polémicas. Darwin estava consciente das dificuldades da tarefa. Por isso, depois desta viagem, recolheu-se em longo estudo, adiando a publicação da tese, avesso aos confrontos inevitáveis perante reacções desfavoráveis, inclusive da mulher que amava, uma crente fervorosa. Utilizou pela primeira vez, de forma sistemática, o método hipotético-dedutivo, em que uma hipótese é testada, determinando se as deduções dela obtidas são corroboradas pela observação ou outras formas de escrutínio. Só decidiu publicar os resultados quando, por circunstâncias externas, verificou que já não era possível adiar mais.
Já no século XX as descobertas da biologia em geral, e da genética em particular, vieram corroborar as conclusões de Darwin.
A propósito desta viagem, escreveu Venerando de Matos no seu blogue PEDRAS ROLANTES (http://venerandomatos.blogspot.com/) :
Qual seria o jovem cientista dos nossos dias que se proporia a fazer uma volta ao mundo durante cinco anos, sujeitando-se às mais duras condições de sobrevivência, como o fez Darwin em 1836, com 22 anos, a bordo do navio da Real Marinha Britânica HMS Beagle?
E quem seria o jovem cientista que, sem se preocupar com o êxito fácil imediato e mediático, se submeteria a esperar quase mais vinte anos para publicar a sua obra fundamental e desafiar os dogmas estabelecidos?
É esse espírito de aventura, de curiosidade e de paixão permanente pelo conhecimento que é, quanto a mim, o grande exemplo da vida de Darwin.
VIDA DE DARWIN
1809 (12 Fev) – nasce em Shrewsbury, Oeste da Inglaterra.
1827 a 1831 - Estuda Teologia na Universidade de Cambridge, depois de frequentar Medicina para a qual não se considerou vocacionado.
1831 a 1836 – Longa viagem de circum-navegação da Terra a bordo do barco Beagle, como cientista.
1837 – Casado, instala-se perto de Londres. Faz inúmeros estudos de botânica, zoologia e geologia. Tem dez filhos. A herança de família permite-lhe o sustento e a dedicação total ao trabalho de investigação.
1859 – Publicação do livro A Origem das Espécies, que abala o mundo.
1864 – Condecorado com a mais alta distinção científica, a medalha da Royal Society de Londres.
1882 (19 Abr) – Morre e é enterrado com honras oficiais na Abadia de Westminster, o panteão nacional inglês.
A IGREJA E DARWIN
O debate sobre a teoria da evolução é cada vez mais forte, tanto no âmbito cristão como no estritamente evolucionista, e cientistas, filósofos e teólogos cristãos estão directamente envolvidos no debate. Mais uma vez uma autoridade da Santa Sé declara que a Igreja aceita a teoria da evolução, desde que guiada por Deus. Desta vez foi o presidente do Conselho Pontifício para a Cultura e também presidente da Comissão Pontifícia para os Bens Culturais da Igreja, arcebispo Gianfranco Ravasi quem se manifestou, no 17 de setembro de 2008 (ZENIT.org).
Dom Ravasi recordou dois pronunciamentos históricos sobre a evolução do Magistério pontifício: a encíclica Humani Generis, de Pio XII, de 12 de agosto de 1950, e a Mensagem de João Paulo II à Plenária da Academia Pontifícia de Ciências, de 22 de outubro de 1996. Entre outras coisas afirmou que “Não existe «a priori» incompatibilidade entre as teses de Charles Darwin e a Bíblia”. (in Site http://blog.cancaonova.com/felipeaquino/ )