ACÇÃO E CONTEMPLAÇÃO
Nesga de território entalada entre a Galiza, Castela e o Atlântico, a terra portuguesa cresceu para sul, empurrando as gentes mouras. Mas ao sul também havia mar. Após três séculos de guerras ofensivas e defensivas com os povos a leste, aos portugueses do século XV impôs-se a aventura oceânica. Dramáticas e dolorosas conquistas no norte de África. Mas também viagens mar adentro em exploração planeada e científica.
Sobre o Portugal dos Descobrimentos escreveu Manuel Alegre: «Antes de ti o mar era mistério. / Tu mostraste que o mar era só mar./ Maior do que qualquer império / foi a aventura de partir e de chegar. ». Porém, a extensão do Império superou a capacidade de o realizar. Por isso Fernando Pessoa sublinhou: «Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez. / Senhor, falta cumprir-se Portugal.»
O mar continua a fascinar os nossos olhos, contemplação e desejo de partir. Mas há quem porfie na acção de tirar dele sustento próprio e alheio, pesca de dores sem esperança.
Os poetas olham-no e escrevem. Olham e escrevem. São eles que dão voz à nossa contemplação.
Tanto mar!
Nesga de território entalada entre a Galiza, Castela e o Atlântico, a terra portuguesa cresceu para sul, empurrando as gentes mouras. Mas ao sul também havia mar. Após três séculos de guerras ofensivas e defensivas com os povos a leste, aos portugueses do século XV impôs-se a aventura oceânica. Dramáticas e dolorosas conquistas no norte de África. Mas também viagens mar adentro em exploração planeada e científica.
Sobre o Portugal dos Descobrimentos escreveu Manuel Alegre: «Antes de ti o mar era mistério. / Tu mostraste que o mar era só mar./ Maior do que qualquer império / foi a aventura de partir e de chegar. ». Porém, a extensão do Império superou a capacidade de o realizar. Por isso Fernando Pessoa sublinhou: «Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez. / Senhor, falta cumprir-se Portugal.»
O mar continua a fascinar os nossos olhos, contemplação e desejo de partir. Mas há quem porfie na acção de tirar dele sustento próprio e alheio, pesca de dores sem esperança.
Os poetas olham-no e escrevem. Olham e escrevem. São eles que dão voz à nossa contemplação.
Tanto mar!
Mar Português
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso , ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor,
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa, Mensagem
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso , ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor,
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa, Mensagem
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Mar sonoro
Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim,
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho,
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só para mim.
Sophia de Mello Breyner Andresen
In Cem Poemas de Sophia
Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim,
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho,
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só para mim.
Sophia de Mello Breyner Andresen
In Cem Poemas de Sophia
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Epigrama
Há só mar no meu País
Não há terra que dê pão:
Mata-me de fome
A doce ilusão
De frutos como o sol.
Uma onda, outra onda
O ritmo das ondas me embalou.
Há só mar no meu País:
E é ele quem diz,
É ele quem sou.
Afonso Duarte ( 1884-1958)
Há só mar no meu País
Não há terra que dê pão:
Mata-me de fome
A doce ilusão
De frutos como o sol.
Uma onda, outra onda
O ritmo das ondas me embalou.
Há só mar no meu País:
E é ele quem diz,
É ele quem sou.
Afonso Duarte ( 1884-1958)
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Canção
Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
-depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.
Minhas mãos ainda estão molhadas
Do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre dos meus dedos
colore as areias desertas.
O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio…
Chorarei quando for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.
Depois, tudo estará perfeito:
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.
Cecília Meireles, Viagem
Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
-depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.
Minhas mãos ainda estão molhadas
Do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre dos meus dedos
colore as areias desertas.
O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio…
Chorarei quando for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.
Depois, tudo estará perfeito:
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.
Cecília Meireles, Viagem
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O céu, a terra, o vento sossegado…
As ondas que se estendem pela areia…
Os peixes que no mar o sono enfreia…
O nocturno silêncio repousado…
O pescador Aónio que, deitado
onde co o vento a água se meneia,
chorando, o nome amado em vão nomeia,
que não pode ser mais que nomeado.
“Ondas – dizia – antes que Amor me mate,
tornai-me a minha Ninfa, que tão cedo
me fizeste à morte estar sujeita”.
Ninguém responde; o mar de longe bate;
move-se brandamente o arvoredo;
leva-lhe o vento a voz, que ao vento deita.
As ondas que se estendem pela areia…
Os peixes que no mar o sono enfreia…
O nocturno silêncio repousado…
O pescador Aónio que, deitado
onde co o vento a água se meneia,
chorando, o nome amado em vão nomeia,
que não pode ser mais que nomeado.
“Ondas – dizia – antes que Amor me mate,
tornai-me a minha Ninfa, que tão cedo
me fizeste à morte estar sujeita”.
Ninguém responde; o mar de longe bate;
move-se brandamente o arvoredo;
leva-lhe o vento a voz, que ao vento deita.
Luís de Camões, Sonetos
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O MAR
Antes que o sonho (ou o terror) tecera
Mitologias e cosmogonias,
antes que o tempo se cunhasse em dias,
o mar, sempre o mar, já estava e era.
Quem é o mar? Quem é o violento
e antigo ser que destrói os pilares
da terra, e é só um e muitos mares,
e abismo e resplendor e azar e vento?
Quem o olha vê-o pela vez primeira,
sempre. Com o assombro tal que as coisas
elementares deixam, as formosas
tardes, a lua, o fogo da fogueira.
Quem é o mar, quem sou? Sei-o no dia
que virá logo após minha agonia.
Jorge Luís Borges, in Rosa do Mundo 2001 Poemas para o Futuro,
2ª ed., Assírio e Alvim, (trad. José Bento)
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PORES DO SOL
Se eu fosse pintor passava a minha vida a pintar o pôr do sol à beira-mar. Fazia cem telas, todas variadas, com tintas novas e imprevistas. É um espectáculo extraordinário.
Há-os em farfalhos, com largas pinceladas verdes. Há-os trágicos, quando as nuvens tomam todo o horizonte com um ar de ameaça, e outros doirados e verdes, com o crescente fino da lua no alto e do lado oposto a montanha enegrecida e compacta.
Tardes violetas, neste ar tão carregado de salitre que torna a boca pegajosa e amarga, e o mar violeta e doirado a molhar a areia e os alicerces dos velhos fortes abandonados…
Um poente desgrenhado, com nuvens negras lá no fundo, e uma luz sinistra. Ventania. Estratos monstruosos correm do norte. Sobre o mar fica um laivo esquecido que bóia nas águas – e não quer morrer…
Raul Brandão,in Os Pescadores,
Se eu fosse pintor passava a minha vida a pintar o pôr do sol à beira-mar. Fazia cem telas, todas variadas, com tintas novas e imprevistas. É um espectáculo extraordinário.
Há-os em farfalhos, com largas pinceladas verdes. Há-os trágicos, quando as nuvens tomam todo o horizonte com um ar de ameaça, e outros doirados e verdes, com o crescente fino da lua no alto e do lado oposto a montanha enegrecida e compacta.
Tardes violetas, neste ar tão carregado de salitre que torna a boca pegajosa e amarga, e o mar violeta e doirado a molhar a areia e os alicerces dos velhos fortes abandonados…
Um poente desgrenhado, com nuvens negras lá no fundo, e uma luz sinistra. Ventania. Estratos monstruosos correm do norte. Sobre o mar fica um laivo esquecido que bóia nas águas – e não quer morrer…
Raul Brandão,in Os Pescadores,
ORLA MARÍTIMA
O tempo das suaves raparigas
É junto ao mar ao longo da avenida
Ao sol dos solitários dias de Dezembro
Tudo ali pára como nas fotografias
É a tarde de Agosto o rio a música o teu rosto
alegre e jovem hoje ainda quando tudo ia mudar
(...)
Ruy Belo, Todos os Poemas
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O MAR
Nascer…morrer…nada perguntes.
São simplesmente acontecimentos.
No meio, um mar tempestuoso.
E isto é o que sabemos.
No meio, um mar, sobre suas ondas
confiadamente naveguemos
deixando-nos levar, deixando-nos
levar…Nossas paixões são seus ventos.
Bem que de súbito se soltem
poderes que não conhecemos,
e se povoe nossa solidão
de promontórios de mistério,
siga a nave o seu caminho
real contra o incerto,
siga a vida, siga sempre, avance
tenaz seu rumo contra o pensamento.
Alfonso Costafreda, in Rosa do Mundo 2001 Poemas para o Futuro,
2ª ed., Assírio e Alvim, (trad. José Bento)
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MAR INCERTO
Que triste o som acorda à minha voz !
Como é pálida a luz do meu espelho
e a desse rio azul que não tem foz :
o tempo, em que me vou fazendo velho.
Dias loucos da infância, onde estais vós?
E a alegria – esse cântico vermelho
do sangue virgem que não tem avós?
Como se chama a sombra em que ajoelho?
Arfa, cansado, no meu peito, um mar:
o mar remoto da remota Ilha
onde as sereias cantam ao luar.
A esteira dos navios, as gaivotas
gritam no céu, e o céu, lânguido, brilha
sem ecos de vitórias ou derrotas.
António de Sousa, in Rosa do Mundo 2001 Poemas para o Futuro,
2ª ed., Assírio e Alvim
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O MAR
Nascer…morrer…nada perguntes.
São simplesmente acontecimentos.
No meio, um mar tempestuoso.
E isto é o que sabemos.
No meio, um mar, sobre suas ondas
confiadamente naveguemos
deixando-nos levar, deixando-nos
levar…Nossas paixões são seus ventos.
Bem que de súbito se soltem
poderes que não conhecemos,
e se povoe nossa solidão
de promontórios de mistério,
siga a nave o seu caminho
real contra o incerto,
siga a vida, siga sempre, avance
tenaz seu rumo contra o pensamento.
Alfonso Costafreda, in Rosa do Mundo 2001 Poemas para o Futuro,
2ª ed., Assírio e Alvim, (trad. José Bento)
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MAR INCERTO
Que triste o som acorda à minha voz !
Como é pálida a luz do meu espelho
e a desse rio azul que não tem foz :
o tempo, em que me vou fazendo velho.
Dias loucos da infância, onde estais vós?
E a alegria – esse cântico vermelho
do sangue virgem que não tem avós?
Como se chama a sombra em que ajoelho?
Arfa, cansado, no meu peito, um mar:
o mar remoto da remota Ilha
onde as sereias cantam ao luar.
A esteira dos navios, as gaivotas
gritam no céu, e o céu, lânguido, brilha
sem ecos de vitórias ou derrotas.
António de Sousa, in Rosa do Mundo 2001 Poemas para o Futuro,
2ª ed., Assírio e Alvim
4 comentários:
Tanto mar...esse mundo que enche de azul as distâncias!!!!
Mar de sereias, de peixes estranhos,de mitos e sonhos, de negras ameaças, de naufrágios de angústias repetidas...
Mar de areias brilhantes, conchas maravilhadas,búzios ecos das ondas e da brisa...
Mar de nós mesmos, na praia da vida, encostados à falésia dos dias...enquanto o sol adormece nas ondas e a lua nos aproxima das estrelas!!!
"Brigados" por este post!!!!
Profundamente siderada por esta 'profusão de mar' em versos portugueses! Selecção lindíssima!!
Não há dúvida que o nosso país é feito de mar! Só mar... tanto mar!
saudações de alguém que sem mar morreria!
Obrigado pela visita.
Quanto à selecção, ela foi feita quase por inteiro por alguém que ama esta página e a quem agradeço do coração.
Fique bem.
Nice blog. Thats all.
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