Recordo o post de 29/03/2009:
http://lugaronde.blogspot.pt/2009/03/mia-couto.html
Parabéns, Mia Couto!
Lembro-me da impressão que me causou a leitura de A VARANDA DO FRANGIPANI, há uns anos, e de como nunca mais deixei de ler este inventor de escritas, traço de união entre Portugal e Moçambique, homem de rara sensibilidade, cidadão atento ao mundo.
Mais tarde descobri a sua poesia
Curiosamente, sendo um criativo na prosa, Mia Couto faz uma poesia aparentemente banal, recusando os experimentalismos em que certa poesia portuguesa se atolou no final do séc. passado. Mas o sopro criativo também lá está. Sem códigos fechados nem metáforas rebuscadas, esta poesia é límpida, cristalina. Apetece partilhá-la.
Para Ti
Foi para ti
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo
Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que talhei
o sabor do sempre
Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só
amando de uma só vida
Mia Couto, in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo
Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que talhei
o sabor do sempre
Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só
amando de uma só vida
Mia Couto, in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"
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